O mais difícil do mundo

A 33a rodada do Italiano provocou algumas reflexões posteriores. A mais gritante delas é que o Italiano desta temporada reafirma-se como o torneio doméstico mais disputado de todos entre os países de elite no futebol. A cinco rodadas do final (e uma do que seria o final do antigo campeonato de 18 times), não só todos os times estão na luta por alguma coisa como alguns ainda se encontram em águas que podem desembocar em destinos diferentes.

Um exemplo: O Cagliari está na metade da tabela, com 43 pontos. Cinco pontos à sua frente, está o Palermo, último colocado que iria para a Copa da UEFA, se o torneio acabasse hoje. Seis pontos atrás, no entanto, estão dois times que estariam rebaixados, com 34 pontos. Com três confrontos diretos, o time sardo pode lutar por uma vaga UEFA ou contra o rebaixamento.

Nesta semana, vamos dar uma olhada em cada ‘setor’ da Série A desta temporada: a luta pelo ‘scudetto’, a luta pelas vagas na Liga dos Campeões, a luta pelas vagas na Copa UEFA e a luta contra o rebaixamento.

Cabeça a cabeça: desempate marcado

A semana que se encerrou demonstrou quanto sangrenta ainda vá ser a luta pelo título italiano. A Juve tinha uma vantagem depois da derrota milanista para o Siena, mas perdeu para a Inter e só bateu a Lazio com um gol no final, evitando a liderança dos atuais campeões. Briga feia.

Nos últimos anos, o título sempre foi decidido com disputas que desafiam os marcapassos. Neste ano, nada mudou. Mas ainda há um diferencial: o Milan disputa a Liga dos Campeões e a Juventus não. Isso certamente conta, e tira a diferença que o time de Milão tem. O elenco milanista é maior, mas terá dois jogos dificílimos além dos que a Juventus enfrentará.

A corrida pelo título passa por dois setores: o meio-campo milanista e o ataque juventino. Contra o Parma, pela primeira vez o Milan se achou sem Pirlo em campo, com Seedorf fazendo as vezes de Pirlo e com Ambrosini fechando os espaços. Carlo Ancelotti terá de garantir alternativas para o Milan não ser ‘Pirlo-dependente’. Quando o armador não joga, o meio-campo tem de jogar de forma diferente. Superado esse problema, nada atrapalhará.

Na Juventus, ao incômodo de um elenco curtíssimo, se adicionou uma suspensão de três jogos para Ibrahimovic, o jogador ‘bianconero’ mais em forma hoje. Com Trezeguet e Del Piero a meio-serviço, Zalayeta é o único nome para o ataque com 100% de disposição. Fabio Capello terá de encontrar soluções para não depender de magias como a que Nedved fez no Olímpico.

Por uma vaga na Europa que conta

Com duas das quatro vagas da LC já decididas (Milan e Juventus), quatro outros times ainda correm para pegar os postos que dão acesso à terceira fase eliminatória da competição mais importante da Europa. Entre Inter (59) e Udinese (53), seis pontos parecem bastante coisa, mas não são. Prova disso é que a derrota interista em Messina cortou em 1/3 a diferença dos milaneses para a Sampdoria. Ainda há o Palermo, mas a diferença de sete pontos para a Samp é bem difícil de ser tirada.

Em termos de forma, não resta dúvida que A Samp é a melhor esquadra no momento. O clube genovês resolveu seu problema ofensivo, com Flachi e Kutuzov, e tem um meio-campo entre os mais sólidos do torneio. A Udinese não tem a forma que teve semanas atrás, mas ainda assim, conseguiu três pontos em Siena. A Inter, como sempre, é a que mais desperdiça chances e recursos. Tem um elenco muito superior no papel, mas é um rascunho de time.

Fator preponderante na corrida-Champions: o calendário. A Inter tem a vantagem na tabela e um calendário teoricamente mais simples (Siena, Brescia, Livorno, Sampdoria e Reggina). A Sampdoria tem a vantagem de jogar contra as duas adversárias (Udinese em Udine e Inter em Genova). Para a Udinese, o trunfo pode ser os poucos desfalques. Nenhum titular absoluto está fora de combate.

Taticamente, o duelo é desfavorável à Inter. Sem um time de verdade, a Inter, como sempre, precisa de invenções de seus melhores jogadores, além de ter o problema de uma defesa cronicamente flácida (a dupla Materazzi-Mihajlovic é diga de Série B). Udinese e Sampdoria não têm um craque fulgurante, mas têm conjuntos absolutamente confiáveis.

UEFA: o sonho das provinciais

Hoje, Udinese e Palermo estariam classificadas para a Copa da UEFA, mas Livorno e Messina (cinco pontos a menos que o Palermo) estão na briga. De todas as disputas, esta parece a menos árdua. Os dois favoritos (Palermo e Udinese) estão à frente, sendo que a Udinese com uma folga de dez pontos. Não é impossível, mas é duro.

Uma observação cabe ser feita neste momento: Livorno e Messina, se fossem para a Copa da UEFA, teriam um prêmio em dinheiro, mas a história mostra que clubes pequenos que vão para a UEFA acabam pagando o pato no campeonato, porque seus elencos não são numerosos. A verdade é que Livorno e Messina já fizeram bem suas tarefas – escapar do rebaixamento – e agora podem passar as últimas rodadas sem preocupação. Lazio e Cagliari ainda têm chances matemáticas, mas de acordo com a média de pontos dos dois times nesta temporada, só um ‘sprint’ sensacional resolveria.

Rebaixamento

No começo do campeonato, se imaginava que com 40 pontos, um clube se salvaria do rebaixamento. A cinco rodadas do final, os treinadores dos ameaçados já elevaram a cifra para 45. Motivo: a reação dos últimos colocados e a distância ínfima entre os participantes da luta.

Tecnicamente, dez times estão na corrida contra o rebaixamento: Bologna (40), Reggina e Roma (39), Lecce (38), Siena (36), Chievo (35), Fiorentina, Parma e Brescia (34) e Atalanta (31). O Bologna tem uma boa margem de segurança (seis pontos) e enfrenta três adversários diretos (Brescia, Reggina e Chievo), o que lhe dá uma preocupação só aritmética. A Reggina, com um ponto a menos, também tem um pouco mais de oxigênio, mas tem um calendário encardido (pega quatro ameaçados mais a Inter).

Daí para baixo, é só desespero. A Roma, nas últimas sete partidas, fez um mísero ponto contra a Udinese e perdeu as outras seis (Juventus, Cagliari, Milan, Reggina, Siena e Sampdoria). O Lecce paga o preço de ter Zeman como técnico – é um time que não sabe jogar pelo empate. Contra o Livorno, jogou muito melhor e perdeu com um gol no último minuto.

E na região do ultra-desespero, os ânimos são diferentes. Dois pontos separam cinco equipes de duas crateras para a Série B. Siena (36) e Chievo (35) são tão instáveis que não é possível prever o próximo resultado. Fiorentina e Parma (34) entraram numa forma terrível e sofrem com os próprios nervos. E, curiosamente, Brescia (34) e Atalanta (31) são os mais animados, entusiasmados pela seqüência de resultados.

Pelo critério “forma atual”, Roma, Fiorentina e Parma já estão rebaixados, e Atalanta e Brescia se salvarão. Pelo critério “calendário”, os dez times tem uma seqüência de dificuldade similar, com inúmeros confrontos diretos. E no critério “pontuação”, Bologna e Reggina estão salvos, enquanto a Atalanta está morta.

Contudo, o cruzamento de critérios aponta mesmo os confrontos diretos como fator decisivo. A fantástica reação de Atalanta e Brescia deu a confundida final no panorama. Quem roubar mais pontos dos adversários se salva – e esses confrontos são muito equilibrados. Luz vermelha para a Roma e vermelhíssima para Parma e Fiorentina. Se esses times não reverterem a tendência, vão cair.

Estádios, e não jaulas

O vandalismo ocorrido nos estádios italianos nas últimas semanas segue causando mudanças. Na última sexta, a Lega Calcio (entidade que reúne os clubes das Séries A e B) deu a permissão para que o Piacenza transforme o seu estádio, Leonardo Garilli, no primeiro campo italiano sem nenhuma barreira separando torcida e jogadores.

“Mas como? Os torcedores ficam mais violentos e a saída é tirar as barreiras?” Mais ou menos isso. A tese defendida é a de que as barreiras incitam o torcedor a se exceder, uma vez que o trata como um animal. Assim, sem obstáculos, e com uma legislação muito mais rigorosa na punição, a esperança é que a própria torcida ajuste seu comportamento.

O Piacenza se propôs a inaugurar a iniciativa porque tem uma torcida considerada tranqüila e vê na oportunidade uma chance de se marcar como um clube na vanguarda da luta contra a violência. Na Série A, o primeiro estádio a sofrer alterações será o Friuli, de Udine, outro clube que tem arquibancadas normalmente comportadas.

O problema maior virá na hora em que forem “desmilitarizados” estádios de alto risco, como o Olímpico de Roma, o “Atleti Azzurri D’Italia”, de Bergamo e o “Artemio Franchi” de Firenze. Muito provavelmente estes adotarão as novas normas somente depois da legislação ter sofrido alterações, para que os transgressores sejam punidos com uma severidade exemplar.

Penas de prisão mais longas e sem direito a recurso, proibição de comparecimento aos estádios “ad eternum” e adoção do uso de vigilância de câmeras e de agentes de segurança são algumas das medidas que devem ser tomadas. Contudo, tais alterações são dispendiosas, e o “pacote completo” deve passar também pela criação de linhas de crédito governamentais com este fim.

– Dino Zoff está em apuros na Fiorentina

– Desde que chegou, o time não mostrou melhora nenhuma e além disso, os últimos resultados deixaram a torcida contra si.

– Seria curioso ver a Fiorentina retornar à Série B que deixou através de uma tapetada no ano passado.

– Na verdade, a Fiorentina não disputou foi o campeonato da C1, mas um ano a mais fora da Série A não deixaria de ser uma justiça poética.

– A Atalanta está tão contente com a campanha de Delio Rossi que já ofereceu ao treinador uma renovação, para que ele fique mesmo se o time cair.

– A seleção da Trivela da 33a rodada tem holofotes – novamente – sobre a Atalanta.

– Delio Rossi deu um desenho tático ao time além de firmar vários titulares vindos da divisão de base.

– Pelo segundo turno, o time Bergamasco merece ficar na Série A.

– Na classificação geral do torneio, Shevchenko (Milan), Emerson (Juventus) e Toni (Palermo) despontam como candidatos ao prêmio de melhor da temporada.

– Makinwa (Atalanta) é o favorito para o prêmio de revelação.

– Storari (Messina); Motta (Atalanta), Sacchetti (Sampdoria) e Sala (Atalanta); Kaká (Milan), Di Biagio (Brescia), Donati (Messina) e Nedved (Juventus); Di Michele (Udinese) e Lucarelli (Livorno) .

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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