A casa caiu

Ao terceiro apito do árbitro Konrad Plautz, no fim de Milan 0 x 2 Arsenal, o semblante do time em campo era soturno – assim como nas arquibancadas do Giuseppe Meazza. Nas redações italianas e do mundo, o burburinho de uma “reformulação profunda” no clube estava com força total. No entanto, a torcida aplaudiu os jogadores, que retribuíram. Presidente e vice do clube desceram ao vestiário e agradeceram os jogadores (mesmo os reservas) e técnico, individualmente. Parece uma contradição?
Mais do que isso. Não há dúvidas de que o Milan fez o que pôde contra um Arsenal muito mais forte fisicamente e a temporada comprovou as limitações de um elenco carente. Haverá uma revolução? Tudo indica que não, ainda que os ‘bem-informados’ de plantão insistam no contrário.
A diretoria e comissão técnica certamente erraram na montagem do elenco para esta temporada – fato indiscutível. A um elenco de idade avançada, agregaram-se somente Alexandre Pato (a partir da metade dela) e Ba, um ex-jogador que provavelmente foi contratado por questões pessoais, a exemplo do holandês Esajas há alguns anos (que era amigo de infância de Seedorf). Ah, sim, também chegou Emerson, mas para azar do brasileiro, numa região do time em que o elenco não precisava de reforços.
A crítica mais comum ao Milan – a idade do elenco – é válida, mas não totalmente. O jogador mais velho do grupo, o lendário Paolo Maldini, foi um monstro nos últimos três jogos e deixou claro: se não tiver de atuar em 60 jogos no ano, ainda é um fora-de-série. E uma melhora nas condições de seu joelho o prontificaram a repensar a aposentadoria e cogitar mais um ano em ‘rossonero’.
Exaustão física, contusões e limitações de um grupo carente tecnicamente (leia abaixo) tiraram o Milan da briga domestica e internacionalmente. Contra o Arsenal, o cansaço do Milan foi claro nos dois jogos e não fosse o ‘bunker’ e a ausência de um artilheiro nato no time inglês, dois placares de 3 a 0 não seriam injustos, assim como os 18 pontos que separam Inter e Milan no campeonato também não o são.
O clima no elenco parece sereno e uma vaga na Liga dos Campeões (agora a um ponto de distância) está ao alcance. Com um jogo por semana, recuperando Seedorf, Jankulovski e Gattuso, apostar no Milan na quarta colocação da Série A em maio é seguro, ainda que o time não tenha um goleiro confiável, nem substitutos para a maioria das posições. Mais do que nunca, o time precisará de sua experiência. Felizmente para Kaká e companhia, isso sobra em Milanello.
Mercado mirado?

Pegando-se o time base do Milan (Dida; Oddo, Nesta, Maldini e Kaladze; Gattuso, Pirlo, Seedorf e Kaká; Gilardino (Inzaghi) e Pato), só nos extremos – o gol e o ataque – é que há necessidade urgente de reforços. Já no banco de reservas, uma longa lista de dispensas seria conveniente (Cafu, Serginho, Gourcuff, Favalli, Fiori, Ba e um entre Simic e Bonera).
Aí que jaz o problema que trouxe o Milan abaixo na LC – a necessidade de rodízio. No elenco como um todo, vários adversários europeus como Manchester United, Real Madrid, Barcelona, e alguns domésticos, como Inter e até mesmo a Roma, têm reservas mais próximos da qualidade dos titulares. Sob esta ótica, sim, se deve falar em necessidade de uma ‘revolução’ no Milan.
Só que a navalha não deve cortar tão fundo. O ambiente em Milanello leva muito em conta os vínculos pessoais e sob este aspecto, é difícil imaginar uma demissão em massa acontecer. Renovações de contrato recentes, como (e principalmente) a de Kaká, até 2013, sugerem que o grupo sabe o que vai acontecer e está todo de acordo.
As contratações no Milan dividem-se entre as ‘urgentes’, as ‘necessárias’ e as ‘convenientes’, seguindo uma ordem de gradação. Na primeira categoria, sem dúvida, estão as de um goleiro e um centroavante. Dida não perdeu a posição por preconceito ou perseguição, como eventualmente se vê a mídia brasileira sugerir, mas porque não tem uma boa performance há tempos. Apesar da fase regular, Kalac dá, no máximo, um bom reserva. Na frente, Gilardino não dá conta do recado e Inzaghi, 34 anos, é ótimo para atuar em 30 jogos no ano, mas insuficiente para uma temporada, especialmente com Pato ainda amadurecendo.
Entre as ‘necessárias’, o Milan faria bem em investir em um zagueiro central jovem, além de alternativas (também jovens) para as laterais da defesa. A retaguarda milanista, mesmo com alta média de idade (quase 34 anos) é a segunda melhor da Série A e se mantiver a média de 0,7 gols sofridos por jogo, está ótimo. Só que é prudente pensar no futuro e um dia Nesta e até Maldini vão parar de jogar.
Na categoria ‘convenientes’, o clube poderia dar a Carlo Ancelotti mais uma alternativa de jogo pelas alas (fala-se insistentemente em Zambrotta, do Barcelona) e tentar encontrar alguém para cobrir o papel de Pirlo, mesmo que isso significasse maturar um jogador novo. O esquema do Milan é ‘Pirlo-dependente’ e quando o bresciano não atua, o time se ressente. Alternativas possíveis? Uma improvisação de Seedorf na posição ou a escalação de Kakha Kaladze ali – na verdade, sua posição de origem no Dínamo Kiev e Dínamo Tbilisi.
O internauta pode se perguntar: “ah, mas o Milan já não precisava disso tudo no ano passado?”. É, precisava. Mas em favor da diretoria de Via Turati, pode-se argumentar que Dida não estava tão mal, que Ronaldo dava sinais de uma recuperação definitiva e mesmo Gilardino tinha marcado seus golzinhos (16, na última temporada). Daí fica a dúvida sobre qual será a atitude no mercado. Se não agir como um clube grande, o próximo será ainda pior, com o time um ano mais velho, com a Juventus mais poderosa e com Inter e Roma mais reforçadas.
Risco Parma, Cagliari condenado

A demissão do sétimo treinador na Série A (Domenico Di Carlo, do Parma) dá uma dimensão de quão caótico é o ambiente do atual torneio. Cagliari, Empoli, Livorno, Palermo, Reggina e Siena também já alteraram o comando (alguns, mais de uma vez) e arriscaram-se a virar estatística. Com tudo, com tanta gente chutando o balde, demitir o técnico deixou de ser quesito pró-rebaixamento.
Di Carlo pagou um preço pelo qual tem uma parcela de responsabilidade. Embora tenha a base muito jovem, o time tem um elenco para estar numa posição melhor do que a atual. Com Cristiano Lucarelli no ataque e alguns dos mais promissores jovens italianos da Série A (Dessena, Cigarini, Paci, Moretti, Mariga), os resultados do Parma ainda são perigosamente inconstantes.
Os favoritos para assumir o cargo, Nevio Scala e Alberto Zaccheroni, têm cancha suficiente para reverter o quadro. Scala conduziu o Parma em uma das melhores fases de sua história (dirigiu o time na Liga dos Campeões) e Zaccheroni, entre altos e baixos, fez uma Udinese formidável em 1998.
Quem parece mesmo fadado a passar um ano sabático na Série B é o Cagliari. Depois de todas as presepadas de seu proprietário, Massimo Cellino, o time é uma âncora e a última colocação lhe pertence desde a 13a rodada, consecutivamente. De lá para cá, somente duas vitórias em 15 jogos.
Seis clubes, três vagas

Uma derrota do Pisa e empates de Lecce Bologna e Chievo mergulharam a Série B numa corrida emocionante novamente, favorecendo o Brescia (numa reação considerável) e o líder improvável Albinoleffe. Cinco pontos separam o sexto colcado Pisa do líder de Bérgamo.
E são exatamente esses dois times – Pisa e Albinoleffe – que se enfrentam na partida mais interessante da próxima rodada. Na Arena Garibaldi, de Pisa, o clube que despontou como sensação do campeonato ateará fogo na disputa caso vença o ‘Leffe’, que nesse caso poderá ser ultrapassado por Bologna e Chievo (que recebem Piacenza e Ascoli). O Lecce visita o Spezia (que derrubou o Verona na última temporada) e o Brescia viaja a Mantova, um perigoso adversário, que está na ponta do ‘segundo bloco’ da tabela.
Curtas

– O clube de Appiano Gentile completou um século numa das melhores fases de sua história. E as comemorações foram merecidas.
– Leia o ‘Conheça o Clube’ feito por Dassler Marques, sobre um dos maiores clubes do mundo.
– Júlio César (Inter); Loria (Siena), Grygera (Juventus), Maldini (Milan) e Radu (Lazio); Ambrosini (Milan), De Rossi (Roma) e Camoranesi (Juventus); Kaká (Milan); Totti (Roma) e Pandev (Lazio).

A casa caiu
Ao terceiro apito do árbitro Konrad Plautz, no fim de Milan 0 x 2 Arsenal, o semblante do time em campo era soturno – assim como nas arquibancadas do Giuseppe Meazza. Nas redações italianas e do mundo, o burburinho de uma “reformulação profunda” no clube estava com força total. No entanto, a torcida aplaudiu os jogadores, que retribuíram. Presidente e vice do clube desceram ao vestiário e agradeceram os jogadores (mesmo os reservas) e técnico, individualmente. Parece uma contradição?
Mais do que isso. Não há dúvidas de que o Milan fez o que pôde contra um Arsenal muito mais forte fisicamente e a temporada comprovou as limitações de um elenco carente. Haverá uma revolução? Tudo indica que não, ainda que os ‘bem-informados’ de plantão insistam no contrário.
A diretoria e comissão técnica certamente erraram na montagem do elenco para esta temporada – fato indiscutível. A um elenco de idade avançada, agregaram-se somente Alexandre Pato (a partir da metade dela) e Ba, um ex-jogador que provavelmente foi contratado por questões pessoais, a exemplo do holandês Esajas há alguns anos (que era amigo de infância de Seedorf). Ah, sim, também chegou Emerson, mas para azar do brasileiro, numa região do time em que o elenco não precisava de reforços.
A crítica mais comum ao Milan – a idade do elenco – é válida, mas não totalmente. O jogador mais velho do grupo, o lendário Paolo Maldini, foi um monstro nos últimos três jogos e deixou claro: se não tiver de atuar em 60 jogos no ano, ainda é um fora-de-série. E uma melhora nas condições de seu joelho o prontificaram a repensar a aposentadoria e cogitar mais um ano em ‘rossonero’.
Exaustão física, contusões e limitações de um grupo carente tecnicamente (leia abaixo) tiraram o Milan da briga domestica e internacionalmente. Contra o Arsenal, o cansaço do Milan foi claro nos dois jogos e não fosse o ‘bunker’ e a ausência de um artilheiro nato no time inglês, dois placares de 3 a 0 não seriam injustos, assim como os 18 pontos que separam Inter e Milan no campeonato também não o são.
O clima no elenco parece sereno e uma vaga na Liga dos Campeões (agora a um ponto de distância) está ao alcance. Com um jogo por semana, recuperando Seedorf, Jankulovski e Gattuso, apostar no Milan na quarta colocação da Série A em maio é seguro, ainda que o time não tenha um goleiro confiável, nem substitutos para a maioria das posições. Mais do que nunca, o time precisará de sua experiência. Felizmente para Kaká e companhia, isso sobra em Milanello.
Mercado mirado?
Pegando-se o time base do Milan (Dida; Oddo, Nesta, Maldini e Kaladze; Gattuso, Pirlo, Seedorf e Kaká; Gilardino (Inzaghi) e Pato), só nos extremos – o gol e o ataque – é que há necessidade urgente de reforços. Já no banco de reservas, uma longa lista de dispensas seria conveniente (Cafu, Serginho, Gourcuff, Favalli, Fiori, Ba e um entre Simic e Bonera).
Aí que jaz o problema que trouxe o Milan abaixo na LC – a necessidade de rodízio. No elenco como um todo, vários adversários europeus como Manchester United, Real Madrid, Barcelona, e alguns domésticos, como Inter e até mesmo a Roma, têm reservas mais próximos da qualidade dos titulares. Sob esta ótica, sim, se deve falar em necessidade de uma ‘revolução’ no Milan.
Só que a navalha não deve cortar tão fundo. O ambiente em Milanello leva muito em conta os vínculos pessoais e sob este aspecto, é difícil imaginar uma demissão em massa acontecer. Renovações de contrato recentes, como (e principalmente) a de Kaká, até 2013, sugerem que o grupo sabe o que vai acontecer e está todo de acordo.
As contratações no Milan dividem-se entre as ‘urgentes’, as ‘necessárias’ e as ‘convenientes’, seguindo uma ordem de gradação. Na primeira categoria, sem dúvida, estão as de um goleiro e um centroavante. Dida não perdeu a posição por preconceito ou perseguição, como eventualmente se vê a mídia brasileira sugerir, mas porque não tem uma boa performance há tempos. Apesar da fase regular, Kalac dá, no máximo, um bom reserva. Na frente, Gilardino não dá conta do recado e Inzaghi, 34 anos, é ótimo para atuar em 30 jogos no ano, mas insuficiente para uma temporada, especialmente com Pato ainda amadurecendo.
Entre as ‘necessárias’, o Milan faria bem em investir em um zagueiro central jovem, além de alternativas (também jovens) para as laterais da defesa. A retaguarda milanista, mesmo com alta média de idade (quase 34 anos) é a segunda melhor da Série A e se mantiver a média de 0,7 gols sofridos por jogo, está ótimo. Só que é prudente pensar no futuro e um dia Nesta e até Maldini vão parar de jogar.
Na categoria ‘convenientes’, o clube poderia dar a Carlo Ancelotti mais uma alternativa de jogo pelas alas (fala-se insistentemente em Zambrotta, do Barcelona) e tentar encontrar alguém para cobrir o papel de Pirlo, mesmo que isso significasse maturar um jogador novo. O esquema do Milan é ‘Pirlo-dependente’ e quando o bresciano não atua, o time se ressente. Alternativas possíveis? Uma improvisação de Seedorf na posição ou a escalação de Kakha Kaladze ali – na verdade, sua posição de origem no Dínamo Kiev e Dínamo Tbilisi.
O internauta pode se perguntar: “ah, mas o Milan já não precisava disso tudo no ano passado?”. É, precisava. Mas em favor da diretoria de Via Turati, pode-se argumentar que Dida não estava tão mal, que Ronaldo dava sinais de uma recuperação definitiva e mesmo Gilardino tinha marcado seus golzinhos (16, na última temporada). Daí fica a dúvida sobre qual será a atitude no mercado. Se não agir como um clube grande, o próximo será ainda pior, com o time um ano mais velho, com a Juventus mais poderosa e com Inter e Roma mais reforçadas.
Risco Parma, Cagliari condenado
A demissão do sétimo treinador na Série A (Domenico Di Carlo, do Parma) dá uma dimensão de quão caótico é o ambiente do atual torneio. Cagliari, Empoli, Livorno, Palermo, Reggina e Siena também já alteraram o comando (alguns, mais de uma vez) e arriscaram-se a virar estatística. Com tudo, com tanta gente chutando o balde, demitir o técnico deixou de ser quesito pró-rebaixamento.
Di Carlo pagou um preço pelo qual tem uma parcela de responsabilidade. Embora tenha a base muito jovem, o time tem um elenco para estar numa posição melhor do que a atual. Com Cristiano Lucarelli no ataque e alguns dos mais promissores jovens italianos da Série A (Dessena, Cigarini, Paci, Moretti, Mariga), os resultados do Parma ainda são perigosamente inconstantes.
Os favoritos para assumir o cargo, Nevio Scala e Alberto Zaccheroni, têm cancha suficiente para reverter o quadro. Scala conduziu o Parma em uma das melhores fases de sua história (dirigiu o time na Liga dos Campeões) e Zaccheroni, entre altos e baixos, fez uma Udinese formidável em 1998.
Quem parece mesmo fadado a passar um ano sabático na Série B é o Cagliari. Depois de todas as presepadas de seu proprietário, Massimo Cellino, o time é uma âncora e a última colocação lhe pertence desde a 13a rodada, consecutivamente. De lá para cá, somente duas vitórias em 15 jogos.
Seis clubes, três vagas
Uma derrota do Pisa e empates de Lecce Bologna e Chievo mergulharam a Série B numa corrida emocionante novamente, favorecendo o Brescia (numa reação considerável) e o líder improvável Albinoleffe. Cinco pontos separam o sexto colcado Pisa do líder de Bérgamo.
E são exatamente esses dois times – Pisa e Albinoleffe – que se enfrentam na partida mais interessante da próxima rodada. Na Arena Garibaldi, de Pisa, o clube que despontou como sensação do campeonato ateará fogo na disputa caso vença o ‘Leffe’, que nesse caso poderá ser ultrapassado por Bologna e Chievo (que recebem Piacenza e Ascoli). O Lecce visita o Spezia (que derrubou o Verona na última temporada) e o Brescia viaja a Mantova, um perigoso adversário, que está na ponta do ‘segundo bloco’ da tabela.
Curtas
– O clube de Appiano Gentile completou um século numa das melhores fases de sua história. E as comemorações foram merecidas.
– Leia o ‘Conheça o Clube’ feito por Dassler Marques, sobre um dos maiores clubes do mundo.
– Júlio César (Inter); Loria (Siena), Grygera (Juventus), Maldini (Milan) e Radu (Lazio); Ambrosini (Milan), De Rossi (Roma) e Camoranesi (Juventus); Kaká (Milan); Totti (Roma) e Pandev (Lazio).

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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