Copa&Olimpíada, a Caixa de Pandora brasileira

A última semana foi extremamente cheia de significados para a gestão do esporte no Brasil  e, por extensão, para o próprio Brasil. O país conseguiu se livrar de uma das pessoas públicas mais inssossas e incompetentes dos últimos tempos, o já-foi-tarde Orlando Silva, mas não se livrou do PC do B (que é uma entidade bem bizarra  – um zumbi corrupto morto-vivo, esquizofrênico entre ideologia e preguiça macunaímica). Com o aval do NeoPT (que é a antítese da história do finado PT), o Brasil se encaminha para fazer dois megaeventos esportivos onde o Estado (ndr, nós) vai pagar uma conta astronômica, os barões vão ganhar quantidades de dinheiro estelares e esportivamente, devemos mostrar os dois vexames para os quais ensaiamos com competência..

Hoje, sinceramente, tenho um pouco de pena da presidente Dilma Roussef. Em raras oportunidades na história brasileira, um político no poder esteve tão claramente desconfortável em relação à corrupção estrutural que o sustenta. Por mais que ela tenha sua parcela de responsabilidade no aparato de corrupção instalado no governo, nitidamente, não o endossa. Assim sendo, a demissão de Orlando Silva era praticamente uma formalidade, de tão tóxico que ele conseguia ser como gestor. Infelizmente, a presidente ainda precisa deixar o ministério nas mãos do zumbi stalinisto-albaniano de Aldo Rebello, que depois de duas figuras tão medíocres e inexpressivas, assumiu com pinta de estadista. Quase um Churchill, um Lech Walesa.

O ponto é que além do desastre administrativo (fontes nos bastidores das empreiteiras garantem que nenhuma obra para a Copa será realizada com menos de 50% de ágio sobre o orçamento inicial), o Brasil se encaminha também para um desastre esportivo. O vagalhão de investimentos do governo no esporte de “alto nível” premia o contribuinte com uma performance medíocre até no Panamericano, onde derrotas de modalidades onde historicamente temos tradição (futebol, basquete). Sem falar nas histórias de atletas que ficam sem treinar por causa de porres de treinadores, derrotas históricas, e críticas da CBF ao futebol da Seleção.

Na raiz de tudo isso, está uma confusão que a gestão do NeoPT fez quando começou a descarregar dinheiro público no “esporte de alto nível” (que aliás é uma confusão ideológica que perpassa toda a filosofia de incentivo estatal muito antes do NeoPT). Fomento não é dar dinheiro às pessoas, aos atletas e às empresas. Fomento é investir o dinheiro, recebendo uma contrapartida que beneficie a sociedade como um todo. No Brasil, fomento estatal significa entregar dinheiro aos correligionários ou eleitores domesticados. Historicamente, isso se chama clientelismo, mas com a colaboração de uma militância em negação, ganhou um nome mais bonitinho.

Enquanto a Petrobrás rasga dinheiro patrocinando atletas que deveriam ser incentivados por outros setores da sociedade civil (leia-se, uma inicioativa privada que não fosse indecentemente egoísta), no Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa, 45% das escolas públicas não tem uma quadra de esportes. No resto do país, a situação é diferente – é pior: são só 18%. O Brasil hoje segue sem uma política de massificação do esporte – o único modo que transforma um país numa potência olímpica – embora tenha separado zilhões de reais para montar megaeventos para empreiteiras, políticos demagogos (democraticamente selecionados em todos os espectros) e emissoras de TV semiestatais. Orlando Silva não era o problema, não era a doença. Ele era um sintoma de uma doença para a qual, infelizmente, não vejo uma solução possível. Em 2017, nos daremos conta que a Caixa de Pandora foi aberta quando “ganhamos” a Copa e a Olimpíada. Não sei se bastará a esperança que ela contem nas alegorias míticas.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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