Arséne Wenger contra o dragão da corrupção

Arséne Wenger é um personagem que aprendi a respeitar. Suas primeiras versões do Arsenal comandadas por Henry sempre me pareceram um pouco sem caráter demais. Nunca mudei essa opinião, porque Roi Henry era capaz de apresentações épicas contra o Sunderland, mas em decisões de copas europeias, invariavelmente fracassava. Mesmo assim, em termos de gestão de longo prazo num clube, já sabia admirar Wenger. E hoje, admiro ainda mais.

Wenger está sendo criticado porque o Arsenal não vence nada a há alguns anos. Nonsense. O técnico está comandando o clube num processo quase impossível – o da passagem de um time de segunda linha na Europa para a primeira. Não há precedentes recentes nisso. Chelseas, Manchesters Cities e outros só figuram na primeira linha por causa de uma conta bancária sem fundo, e isso deveria acabar com o Fair Play da Uefa, que é exatamente a razão deste post (logo abaixo, falo mais).

Wenger, sem comprometer o futuro do clube, deu um novo estádio ao Arsenal, decuplicou suas capacidades de arrecadação e manteve o endividamento pela construção do estádio dentro do controle. É quase um milagre. Ele fez isso com suas fantásticas habilidades de revelação e treinamento de jogadores (se Fàbregas tivesse ido menino para o Chelsea, digamos, hoje estaria no Atletico Madrid), aplicação tática e filosofia. Por isso sua irritação com o Manchester City.

o treinador francês está acusando o Manchester City e seus proprietários obscenamente ricos com dinheiro surrupiado do povo do Oriente Médio a “burlar” a legislação da Uefa de antemão, através de “contratos de patrocínio” que na verdade são doação indireta de dinheiro da família do nebuloso sheik árabe dono do clube. Wenger diz – com razão – que se trata de uma maquiagem financeira. De fato, já se sabe nos bastidores que os neoperdulários do futebol europeu (City e Chelsea em primeira mão) não conseguirão atingir o break-even a tempo de se encaixar na lei. Resta saber o que a Uefa vai fazer. se tiver cojones, banirá os dois de competições europeias, o que só piorará as coisas.

O City nega, mas nega a realidade. Wenger, o Arsenal, e outros clubes que não têm o faturamento do Manchester United e Real Madrid, estão sofrendo para manter o clube dentro das contas desde já, uma vez que despesas salariais não se cortam de um ano para o outro. Quando clubes como Milan e Liverpool vendem seus craques hoje é um sinal disso.Viva Wenger. E se a torcida do Arsenal for burra o suficiente para xingá-lo porque não está ganhando troféus, deve se dar conta que nenhum clube do mundo conseguiu construir um estádio sem apertar o cinto e cortar na carne. Isso só acontece no Brasil porque vivemos num país que ri da honra e se tem vergonha de ser honesto.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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