Refém

O Santos não é mais só refém de Neymar. Não só: todo mundo – até ele é refém. Clube, jogador, agente, todos tornaram-se reféns a multa impagável que seu contrato passou a estipular. O jogador, que até agora só decidiu jogos e títulos somente no Campeonato Paulista, não pode ser contrariado, derruba técnicos e não é contestado por quem quer que seja. Ao mesmo tempo, aos 18 anos, entra em campo sabendo que tem de marcar ao menos dois gols por jogo para não ter uma atuação considerada “apagada”. Por sua vez, a diretoria, não pode desagradá-lo ou terá em casa um jogador que não pode ficar nem ser vendido.

O Santos, na gestão atual, apregoou modernidade, mas só se aliou ao que há de mais antigo, retrógrado e nefasto no futebol. Abriu as portas para agentes (notadamente alguns que são ligados a criminosos internacionais), entrou para as filas da CBF e agora também está na linha de frente da implosão dos Clube dos 13, certo de que aumentará sua arrecadação com a TV, mas ignorando todos os preceitos da economia – onde ganha mais quem tem mais audiência. Ah, claro, agora o Santos é o maior campeão brasileiro, uma vez que o Mundial de Bocha, o Estadual Feminino de Showbol e o Sulamericano de Dominó entraram na conta. Deve ser mesmo uma grande vantagem.

A situação do próprio Neymar é delicada. O menino é visivelmente acima da média tecnicamente, mas está inebriado pelo sucesso e, tendo 18 anos, é difícil imaginar que fosse gerenciar sua carreira com inteligência. Sua assessoria é inexistente, a não ser para conseguir novos contratos. Ele não tem inteligência suficiente para compreender que, a cada vez que derruba um técnico, aumenta a carga sobre si, e quando isso ocorre, ele não rende. Sob pressão, na partida contra a Argentina no Sulamericano, não rendeu. Na Libertadores, na partida passada, não rendeu. E enquanto não houver alguém que o tire da linha de fogo, não vai render.

Neymar não é Ganso. Talvez seja até melhor tecnicamente, mas o meia tem uma virtude que Neymar não tem – a de lidar bem com a pressão. Por isso, o Santos de hoje precisa deseperadamente do armador, para deixar Neymar jogar sem ter que decidir (porque sem pressão, Neymar consegue jogar o que pode). Mas para tê-lo definitivamente, terá de fazer mais um contrato faraônico. Só que se não fize-lo, vai manter Neymar no fogo.O mais curioso da história é que com dois jogadores tão excepcionais surgindo em suas fileiras, o clube tenha conseguido fazer tanta bobagem. Bom, se considerarmos que se aliou à CBF por um título de papelão e cogita estender as mãos a Andres Sanches por acreditar em contos de fadas (i.e. achar que vai faturar como o Corinthians nos pagamentos de direitos de transmissão da TV), talvez nem seja uma bobagem assim tão desmedida.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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