Vaga na porrada

“Hanno visto di che pasta siamo fatti?”, perguntou o volante Gennaro Gattuso, ainda encharcado da chuva que caiu em Glasgow durante o confronto com a Escócia. A questão – cuja tradução livre é “vocês viram que tipo de gente nós somos?” – é endereçada aos críticos na seleção e tem no tinhoso milanista um representante daquela que talvez seja sua maior qualidade: uma determinação típica de campeões.

Na noite chuvosa de Hampden Park, a Itália de Roberto Donadoni assegurou sua vaga na Euro-2008 depois de uma fase de classificação na qual jamais jogou um futebol empolgante. A única exceção, talvez, foi no próprio jogo de Hampden, onde a Itália jamais tinha vencido. Contra a Escócia, a seleção tinha uma final. E como aconteceu no Mundial, quando pressionada, a Itália responde.

A escalação final de Donadoni para o jogo foi anunciada como um 4-3-3 e diversos comentaristas chegaram a fazer as tradicionais piadas sobre a vocação defensiva do futebol italiano. No entanto, como sempre, é a estória do galo cantar e não se saber onde.

Não existiu nenhum “tridente” ofensivo da Itália na partida contra a Escócia. O único atacante era Luca Toni. Di Natale e Camoranesi são e se comportaram como dois externos de meio-campo. Danadoni aproveitou a grande fase de Ambrosini para coloca-lo com Gattuso na guarnição da defesa e não se arrependeu. Com Pirlo na armação, a Itália descobriu que o Totti da seleção nunca foi tão indispensável assim.

O rescaldo da aventura da qualificação é a de um Donadoni mais maduro, um grupo que definitivamente quer mantê-lo no cargo e com opções no banco, como Iaquinta, Oddo, Perrotta e De Rossi – não coincidentemente, todos campeões mundiais.

Sim, é verdade que a Itália também ainda precisa melhorar bastante para não ter de confiar somente na sua magistral capacidade de decisão. O trio milanista do meio-campo precisa ser mais regular, Di Natale tem de combinar mais a já existente marcação com inserções ainda inconstantes na área e Oddo tem de voltar a ser o cursor implacável na ala direita. Mas, para quem estava com um pé fora da Euro, a vaga veio para a Itália e trouxe consigo um tanto de esperanças que já se dava por perdido. E assim, outra frase de Gattuso foi um balsamo para o ‘tifoso’ italiano. “Domenech [treinador da França] só sabe falar. Espero encontra-lo no Europeu e dar-lhe outra lição”.

Imperador na Gávea?

A menos que tenhamos uma reviravolta muito radical nos acontecimentos, Adriano não joga mais na Inter de Milão. Na semana passada, o atacante embarcou para São Paulo, enquanto uma nota do clube explicava que o jogador “treinaria numa estrutura altamente qualificada para encontrar sua melhor condição”. Não, não está na nota que ele provavelmente não volta, mas isso parece certo.

Dizer que a situação ‘parece’ certa e não que ‘é’ certa cabe por causa do histórico de Adriano. Ele já foi ‘liberado’ pelo clube para viajar uma vez, quando sua situação na Inter era igualmente insustentável e acabou sendo reintegrado. Isso poderia acontecer de novo, mas agora é menos provável.

A verdade é que o empresário de Adriano, o ex-goleiro Gilmar Rinaldi, faz o possível para que o jogador seja vendido já há pelo menos dois anos. Na imprensa de Milão, se sabe que a situação do jogador no clube é insustentável há muitos meses e sua permanência no clube virou uma questão pessoal da diretoria, que não aceita ser coagida a vender o jogador sob qualquer condição.

Não é menos verdade que Adriano tem sido perseguido por uma série de problemas na sua vida pessoal que fizeram com que sua concentração, disciplina e forma física tenham ido pelo ralo. O jogador de hoje não é nem sombra do matador implacável do Parma. Se é verdade que ele tem responsabilidades a assumir, é igualmente certo que clube e agente não gerenciaram a situação da melhor maneira possível.

Uma vez que no seu desembarque no Brasil, Adriano declarou que “não quer mais voltar à Itália”, tudo indica que de fato já haja negociações para que ele fique num clube brasileiro – emprestado, naturalmente. E o Flamengo surge como a opção mais óbvia, uma vez que é de lá que ele veio.

“Mas o Flamengo tem dinheiro para pagar os salários de Adriano?”, perguntará o internauta. Não, não tem – nem de longe. Mas isso nunca foi problema para o Flamengo, que mesmo com uma dívida impagável, continua investindo. Aliás, o salário de Adriano não pode ser pago por ninguém no Brasil – nem mesmo o campeão brasileiro São Paulo, outro possível destino do jogador – não tem bala na agulha.

O ponto é que ficar no Brasil é vantagem para todo mundo: Adriano tem a oportunidade de reconquistar sua vaga na Seleção – onde o centroavante é Vagner Love, que conhvenhamos, não é exatamente Van Basten; a Inter pode ver o jogador recobrar seu valor de mercado para não ter de vende-lo em baixa e o clube brasileiro que o hospedar passa a ter um jogador alienígena em termos de qualidade no futebol nacional.

O que aconteceria – provavelmente – é que Adriano reduziria seu salário, a Inter o emprestaria de graça e o clube brasileiro faria um esforço com patrocinadores para o negocio acontecer. É possível? É, mesmo que por um período curto, já que Adriano tem qualidade de sobra para jogar em qualquer lugar do mundo.

É muito incrível? Sim, até é. Mas pensemos bem: Se o Clodovil é deputado federal e o governo constrói um estádio e dá para o Botafogo, qual o absurdo de Adriano acabar jogando num clube que deve até a alma? Este é o Brasil, sede da Copa de 2014.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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