Choque de realidade

Pouco, realmente muito pouco a dizer sobre a “Black Wednesday” da Libertadores. Para mim, o único choque foi de ver todas as quedas ocorrerem na mesma noite. Os times brasileiros, por uma série de circunstâncias (entre elas, as falsas certezas adquiridas nos patéticos estaduais e numa primeira fase da Libertadores de nível segunda divisão de Lesoto), acham-se incrivelmente superiores a quaisquer outros. Basta dizer que não falta gente que acha que o Corinthians lutaria pelo título na Itália ou que o Internacional é muito melhor que o Barcelona. Times medianos com ilusão de grandeza só precisam de uma noite ruim para cair. E assim foi.

Que fique claro: exceção feita ao Grêmio, que já tinha tido sinais de que não era superior ao adversário, esperava-se que os brasileiros passassem. O que surpreendeu foi o modo displicente com o qual os brasileiros entraram no jogo, com a sensação de que decidiriam a qualquer momento. Mesmo tendo times não mais que medianos, com resultados favoráveis, os brasileiros eram favoritos, uma vez que não estavam enfrentando Barcelonas ou Manchesters. Das desgraças cariocas, mineiras e gaúchas, o Santos poderia tirar uma valiosa lição, uma vez que também tem um time mediano com um craque (Ganso) e um craque em potencial (Neymar), mas que numa noite decisiva, precisaram depender de seu goleiro, uma vez que um raramente brilhou e o segundo sumiu. Sorte do Peixe que para ser campeão, não é preciso ter o time tão sensacional que alguns acreditam que o Santos seja. Basta ter foco e capacidade de auto-avaliação. Os outros brasileiros não tiveram e hoje estão focados nos Estaduais. Ou nem isso…

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.

15 Comments

  1. Gilson, a questão é sempre relativa. Não existe um Ibrahimovic no Brasil, mas há nomes que conseguiriam ter aqui o mesmo impacto que o Ibra tem lá. O ponto é que, na Europa, grande parte das administrações são amadoras. Aqui, a grande maioria é corrupta, na melhor das hipóteses. Repito o caso do Montillo: é um jogador razoável para bom em termos absolutos, mas no Brasil, é fora de série (assim como o Conca, por exemplo). O mistério é: por que razão Montillos e Concas “aparecem” só com 30 anos? (sei que eles não tem 30 anos, é só uma expressão). Na verdade não é mistério: os clubes são burros demais para garimpar bons jogadores e/ou corruptos demais e só vão atrás de jogadores oferecidos por empresários. Para concluir, concordo que, de maneira geral, na Europa, o dinheiro contrata o melhor (contrariando a regra, o Man City e Yaya Touré, por exemplo, que tem o maior salário da Inglaterra e é um jogador não mais que bom). abs

  2. Para a dupla Cassiano&Michel,

    O poderio econômico dita e continuará a ditar regras não apenas no futebol, mas em diversos setores da atividade humana. O que existe de diferença nisso daqui para a realidade vivenciada na Europa é que lá o dinheiro realmente é capaz de contratar o melhor. Aqui não é bem assim.

    Não sei qual o elenco mais caro do Brasil, mas duvido que nele existam dois ou três jogadores realmente capazes de decidir.

    Quando a gente fala em reforço em um grande europeu, os nomes são de jogadores que podem realmente fazer a diferença em vários jogos de uma temporada. Robben, Eto’o, Ibrahimoviç etc são alguns dos nomes que em tempos recentes mudaram de clube e, depois da chegada deles, o status desse clube foi modificado.

    Aqui, por maior que seja a grana disponível, acho que não existe material humano similar.

  3. Caro, de um ano para outro, tudo pode mudar da água para o vinho. O Fluminense quase caiu em 2009 e foi campeão em 2010. Pelo andar da carruagem, pode voltar a lutar contra o rebaixamento neste ano. Se isso não é uma gangorra técnica, não sei o que há de ser. Quanto à grana, é uma verdade quase absoluta. Dinheiro só funciona se você souber usá-lo. Com menos dinheiro bem usado, é possível fazer muito mais do que com muito mal usado. O Brasil é mais rico do que qualquer vizinho, claro, mas o abismo econômico é muito maior do que o abismo esportivo. Se o Brasil refletisse seu poderio na Libertadores, teria de ter 12 vagas e faria as quartas-de-finais, no máximo, com Boca e River. Sorte da “emoção” que aqui (e na Argentina, como podemos ver) a quantidade de antas de pantufa no comando dos clubes é fenomenal. abs

  4. Cassiano,

    Então os times brasileiros pioraram tanto assim de um ano para cá? Afinal, desde 1994 o Brasil sempre teve mais de um representante nas quartas de final da Libertadores e na temporada passada eram quatro entre os oito.
    No caso dos clubes europeus, o raciocínio financeiro continua valendo: Sem dinheiro, sem time. Obviamente, dinheiro na mão não significa time forte (vide Real Madrid Galático), mas, sem recursos, não é possível ser altamente competitivo.
    Sobre a questão histórica, quis dizer que ela só vale até a página três. O Peñarol só bateu o Inter porque melhorou daquela draga dos últimos anos.
    Bem, é isso.

    Abraços.

  5. Rafael, uma pequena e irônica correção: houve final entre times argentinos em 1984 e 2007: Independente x Grêmio e Boca x Grêmio, respectivamente 😀

  6. Vide o que eu disse ao Michel: os times brasileiros acham que, pelo favoritismo, não precisam se analisar nem analisar o adversário. É como o disclaimer de banco na hora de vc fazer um investimento em DI “Rentabilidade passada não é garantia de lucros futuros”. Daí para o “chupa”, é um passo. abs

  7. Você disse tudo, mas ainda assim se contradisse: sim, historicamente, o Brasil tem feito mais resultados – fato. A questão é que os quatro eliminados são muito piores do que querem crer e piores ainda do que a imprensa de seus estados acredita. E se os times são ruins, a história, não influi – em nada.

    O que transforma Real Madrid, Barcelona e Milan em monstros na Liga dos Campeões não é a história deles, e sim que, na média, entra ano e sai ano, seus times são bons. Se são bons porque são mais ricos, não importa para o resultado – só para a análise de como ele foi construído. O Brasil tem mais grana do que seus vizinhos mortos de fome, fato, mas ignora as virtudes dos rivais.

    Peguemos o Montillo: ele tem 17 anos? Por que só recentemente ele “apareceu”? Ele é o único jogador na América com qualidade e ainda não “descoberto”? E no resto da América não há treinadores melhores do que Tite ou Ricardo Gomes? Vale a pena pagar 200, 250 mil para um Joel Santana ou Celso Roth? Eles realmente entregam esse valor em resultados

    Sim, somos a praça com mais dinheiro, mas em termos de gerência, o Brasil ainda é ridículo. Os outros também são? Bem, se um time como o Libertad, que deve ter um orçamento de uma fração do Fluminense, derruba o Tricolor, algo deve significar. E se nos exemplos das outras três eliminações, a situação é similar, realmente há algo a ser descoberto. abs

  8. Raphael, para mim o Cruzeiro é o melhor time brasileiro hoje, mas isso significa pouco, porque os outros são ainda piores. O problema é mesmo o Cuca, que sofre de Picernismo, uma doença na qual o cidadão sabota o próprio trabalho inconscientemente. Os outros eliminados são todos times medíocres, que crêem-se maiores por conta de imprensas bairristas e ufanistas. O eterno exemplo é o Internacional, que jamais joga o que pode porque se acredita muito melhor do que é (e assim, raramente se esforça). Concordo que nenhum resultado, à luz da razão, tenha sido chocante. O chocante foi caírem todos de uma vez. Mas ainda assim, acredite: a imprensa brasileira continuará acreditando que os times brasileiros são infinitamente melhores que os outros. abs

  9. Alexandre, se vc pensar que, em parte, os estaduais são a razão para espremer o calendário, além da questão de fornecer falsas sensações de força dos clubes, eles são sim um belo fator. Os estaduais são a base da força da CBF. Só por isso, já tinham que acabar. abs

  10. Desde que o São Paulo ganhou o bi em 92/93 as equipes brasileiras são as que tiveram maior sucesso na libertadores. De lá pra cá, são 15 ou 16 finais com pelo menos um brasileiro e já houveram duas finais brasileiras no torneio contra nenhuma de qualquer outro país participante.

    A única equipe que conseguiu meter medo nesse período foi o Boca que entre 2000 e 2004 dominou o torneio.

    Não é a toa que as equipes brasileiras não tem muito respeito pela maioria dos adversários. Só que todo favoritismo precisa ser justificado e é nesse ponto que muito time bom escorrega como o Cruzeiro ontem.

  11. Ao contrário do que muitos disseram nesta quarta-feira, o favoritismo dado aos clubes brasileiros na Copa Libertadores não veio por caso e não é, pelo menos no meu caso, fruto de achismo ou ufanismo. Uma análise do histórico dos times locais na competição mostra um percentual maior de aproveitamento tanto dentro quanto fora de casa e o retrospecto recente aponta para um desempenho médio maior do que o de qualquer outro país. Além disso, o poderio financeiro dos clubes brasileiros não só é maior como tende a sê-lo cada vez mais.
    Então eu pergunto: Não é exatamente assim que se analisa o favoritismo na UEFA Champions League? Não é a partir do poderio financeiro que se evidencia a força dos clubes ingleses? Não é a receita absurdamente maior do que a da concorrência que transforma Barcelona e Real Madrid em alienígenas em La Liga? Ora, quem pode pagar mais tem maiores condições de contratar e manter os melhores elencos e treinadores.
    A eliminação simultânea de quatro times brasileiros nesta quarta-feira foi, sem dúvida, um evento atípico. Como bem lembrou o jornalista Paulo Vinícius Coelho, desde 1991 sempre houve um brasileiro entre os semifinalistas e desde 1994 sempre tivemos mais de um time entre os quadrifinalistas da Libertadores. E, na temporada passada, quatro brasileiros estavam vivos nas quartas-de-final da competição.
    Portanto, antes de se falar em arrogância é preciso falar de constatação. Negar o favoritismo seria, antes de tudo, não manifestar uma opinião por medo ou conservadorismo. O mesmo raciocínio me diz que colocar os quatro times eliminados num mesmo balaio é uma simplificação grosseira. Cada caso é um caso e precisa ser analisado individualmente.
    No que tange o Internacional, além do resultado obtido no Uruguai, havia o entendimento de que o Peñarol era um adversário abordável, embora, logicamente, não estivesse eliminado de véspera. Dentro dessas circunstâncias, a derrota em pleno Beira Rio pode ser considerada, sim, um vexame. E quando se diz isso não significa menosprezo à história dos aurinegros, pentacampeões da Libertadores, mas uma constatação honesta diante do momento do time de Montevidéu e, por consequência, do futebol uruguaio. Mal comparando, é como o Ajax na Liga dos Campeões. Ninguém ignora o passado dos Godenzonen, porém, num confronto com o Chelsea, o favoritismo certamente penderia para o lado dos Blues que nunca conquistaram um título do torneio.
    No caso do Fluminense ficou evidente que não houve arrogância. Talvez tenha sido o contrário. O Tricolor simplesmente abdicou de jogar no Paraguai, levando pressão o tempo todo. No entanto, a eliminação do Cruzeiro foi a que mais me chamou a atenção. Melhor campanha da Libertadores, futebol envolvente e entrosado, tudo indicava uma classificação tranquila após a vitória na Colômbia. Mas, em se tratando de uma equipe comandada por Cuca, tudo é possível.
    Nesse contexto, nada mais lógico do que cada um retirar de sua eliminação a lição necessária para o futuro. Lamentavelmente, esse 4 de maio será lembrado por um bom tempo como o maior tombo coletivo do futebol brasileiro na história do torneio. Entretanto, apesar da queda em conjunto, as soluções são individuais. E enxergar essa data como uma crise do futebol brasileiro é o primeiro passo para não encontrá-las.

  12. Cassiano, tudo bem?

    Em relação ao futebol dos países da América espanhola, tem times de fato ruins, mas também tem algumas equipes muito boas. Once Caldas, LDU e Esitudiantes mostraram qualidade há alguns anos atrás, isso sem falar do Boca “papa títulos” de 2003 e 2007.

    As equipes da América espanhola conseguem compensar deficiências técnicas com raça, e isso é exatamente o que faltou nos clubes brasileiros, jogar com raça não no sentido de bater, mas sim, no sentido de ter vontade, disposição e principalmente não cair na pilha do adversário. Libertadores se ganha com esperteza e concentração o tempo todo, e acho que foi isso que faltou aos times brasileiros na quarta feira passada.

  13. Ainda acho o futebol da américa espanhola patético e medíocre. Correm demais e jogam pouco. O Once Caldas tem um material humano compatível a Ponte Preta e Figueirense, o Peñarol é só um esqueleto do que foi há meio século.

    Os clubes brasileiros tecnicamente ainda são melhores, mas como disse o Fred “acham que só tocando a bola com paciencia o gol vai sair”..concordo com o Cassiano que falta foco, atitude..

  14. O que vi foi mais uma vez o treinador Cuca contaminando a equipe com o seu habitual descontrole emocional. Um cara que me parece bom treinador, mas que é extremamente descontrolado, e por isso que não tenha titulos em sua carreira.

    No mais, os resultados não foram tão abissais assim. O Fluminense venceu o Libertad no jogo de ida num placar muito enganoso e vive um total ambiente de anarquia, e chegou a essa fase num milagre sem tamanho; O Inter arrumou um empate na marra com o Peñarol em Montevidéu e ainda não tinha feito uma partida a altura do que se espera do elenco, além do Peñarol não ser tão ruim quanto falam, não é a máquina que foi nos anos 60, mas é um time que vai voltando a ser protagonista no Uruguai depois de anos de obscuridade.

    Decepção mesmo pra mim foi o Cruzeiro, que parecia ter chances de chegar longe, vinha goleando (o Estudiantes por 2 vezes) mas ai olhei para o banco de reservas e vi o Cuca, e logo voltei a realidade.

  15. RESUMINDO: O brasileiro em geral e parte da imprensa, costuma menosprezar os outros países na Libertadores, com exceção da Argentina e ainda mais o Boca; os outros países tem bons times tb e jogam a vida na competição, sendo que os times brasileiros não são tão superiores aos adversários; será que depois desse fiasco as pessoas terão mais humildade para comentar a competição? Com certeza o calendário do estadual tem de ser diminuido, mas não vejo como causa principal da eliminação.

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