O alvorecer da Bósnia.

Sempre tive um certo fascínio pelo futebol dos países di Leste Europeu. Por ter nascido na década de 70, provavelmente aqueles países me pareciam um tanto quanto míticos, inalcançáveis e misteriosos. Além disso, Iugoslávia, Bulgária, Romênia e Tchecoslováquia sempre tinham produzido grandes jogadores em profusão.

O esfacelamento da Iugoslávia – ou melhor, o restabelecimento de divisões que têm mais a ver com os respectivos povos – diminuiu a atração futebolística da região. A Iugoslávia tinha mais ou menos o mesmo tamanho do estado de São Paulo e os novos Estados são pequenos. Montenegro, por exemplo, tem pouco mais do que metade do tamanho de Sergipe.

Contudo, com toda essa limitação territorial (e por consequencia, de população), a Bósnia tem uma das gerações mais empolgantes de jogadores na Europa. Se antes era o país de um jogador só (Salihamdzic, ex-Bayern, hoje na Juventus), o país de pouco mais de 4 milhões de pessoas hoje está na boca de quem acompanha futebol internacional: Dzeko, Ibisevic, Misimovic, Pjanic enfrentam Espanha e estônia nessa rodada final de jogos das Eliminatórias e têm tudo para ir para a repescagem (tudo mesmo: com uma vitória sobre a Estônia, em Talinn, a Bósnia tira a Turquia do páreo).

O time é treinado por um veterano, Miroslav Blazevic. Ele é um bósnio croata e foi o encarregado de levar a Croácia à semifinal da Copa de 1998. Um colega inglês, Jonathan Wilson, o descreve como um grande motivador que detesta taticismos. Blazevic parece ter mesmo um dom para unir o grupo. Segundo Wilson, que falou com o jovem Pjanic, do Lyon antes da penúltima partida da Bósnia, o promissor craque não se incomodava em ficar no banco de Muratovic, um obscuro jogador do Sturm Graz porque “estava feliz só de estar ali”. Você consegue imaginar Cristiano Ronaldo fazendo o mesmo na mesma idade (19 anos)?

A Bósnia não tem defensores nem meias de alto nível. Por isso mesmo joga com três zagueiros dois volantes e alas com cautela. Mas tem um trio ofensivo – Mismimovic atrás de Dzeko e Ibisevic que poderia, sem exagero, ser titular em qualquer time do mundo. Os dois primeiros, aliás, estão na mira do Manchester United. Isso sem falar do já citado Pjanic. Jogando com três zagueiros, o enigma da Bósnia está em conseguir uma dupla dolantes realmente eficiente aliada a laterais capazes de chegar ao fundo – alternadamente. Se conseguir isso,  tem chances de montar um time realmente candidato a algo mais ousado.

A Bósnia tem um futebol leve por causa desses três e se levarmos em consideração que a seleção ainda não tem 16 anos de existência e que o país foi devastado pela guerra, as chances de evolução são grandes. Não sei se a Bósnia chega na África do Sul (depende mais do sorteio da repescagem do que qualquer outra coisa). Se chegar, já terei a minha “segunda” seleção.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
Top