A melhor

Muita gente poderia se surpreender se, antes da Copa, fosse dito que Fabio Cannavaro levantaria o troféu em Berlim com Marco Materazzi fazendo o gol que manteve a Itália no jogo até os pênaltis. Mas de surpresa o resultado não teve nada.

A Itália se apresentou ao Mundial com um excelente técnico, motivação aos cântaros, vários bons jogadores e um grupo unido. Há bem pouca coisa que se pudesse agregar à combinação.

O sucesso italiano está sendo desmerecido por uma torcida francesa que vaiou a conquista italiana de uma maneira muito deselegante no estádio Olímpico de Berlim. A intenção era a de fazer parecer que a Itália só venceu o jogo porque Materazzi, sujamente, tirou Zidane da partida.

Nada mais falso. Materazzi é mesmo um jogador de técnica limitadíssima, caráter polêmico e um histórico de envolvimento em situações pouco nobres, mas o fato é que na final ele foi muito bem. Está certo – ele fez um pênalti na melhor tradição juniorbaianística – mas jogou na sobra na melhor tradição italiana.

Zidane tomou uma atitude motivado pelo cansaço. Mesmo que o zagueiro italiano tenha sido vil, um jogador com a experiência do francês dificilmente cairia na provocação. Mas fatigado e com a lucidez abalada, o francês caiu. E nem foi a primeira vez. Contra a Arábia Saudita em 1998, Zidane também foi expulso por uma falta tola. E pela Juventus, uma de suas expulsões custou uma eliminação da Liga dos Campeões.

A verdade é que a Itália teve de sobra o que faltou ao Brasil, por exemplo. Disputava todas as bolas como se fossem as últimas, tinha um armador (Pirlo) e um vigilante (Gattuso) jogando muito e uma defesa que nunca deixava ninguém desmarcado.

O título chegou em Roma num momento em que muita gente pode tentar dar uma de esperto para se safar da punição por causa do ‘Calciocaos’. Isso seria extremamente negativo. Mas esportivamente, ninguém pode dizer nada sobre o título italiano. Futebol não é só equilibrar a bola em cima da testa. Aliás, quase nunca é. Se o Brasil pode tirar uma lição do Mundial, esta é a primeira.

Comemorando? Mais ou menos…

Ta bom, a Itália festejou o título, comemorou, cantou e tal. Mas a felicidade certamente não dá a tônica do humor em boa parte dos clubes italianos. Na Juventus, é certo, mas vários outros lugares além de via Galileo Ferraris têm razões para se preocupar.

Naturalmente, Milan, Lazio e Fiorentina estão com as barbas de molho. Um rebaixamento possível deixa todo mundo de cabelo em pé, especialmente porque poderia deletar a Lazio do mapa do futebol.

Só que mesmo clubes como Roma e Inter teriam muito a perder com a condenação em massa do futebol italiano. Uma análise feita por um especialista italiano mostrou que o rebaixamento dos quatro times causaria um êxodo da maioria dos craques destes clubes, já que as opções restantes para empregar os jogadores – leia-se Inter e com um pouco de boa vontade, Roma – não seriam capazes de absorver vinte ou trinta novos nomes.

O que aconteceria então? O valor do campeonato em termos de televisão sofreria um severo baque. Não há estimativa precisa, mas o fato é que os competidores ingleses, espanhóis, alemães e até franceses fossem largamente beneficiados.

O reflexo esportivo também seria pesadíssimo no que se refere à vagas nas competições européias, caso clubes como Empoli e Chievo fossem agraciados com vagas continentais e tivessem de disputá-las com times modestos.

O mercado de futebol de toda a Europa está aguardando o desfecho do caso Moggi, porque o destino dos craques italianos vai decidir tudo. O Milan, por exemplo: se cair, deve perder vários jogadores, mas se não cair, está de olho em Zambrotta, Buffon e Emerson. Faz uma diferença e tanto, não?

Lippi se foi. E agora?

Marcello Lippi fez o que se esperava e não aceitou o apelo para ficar na seleção italiana. Há quem ache que ele perdeu uma boa chance, mas a verdade é que ele tinha tudo a perder e pouco a ganhar ficando no cargo.

Vejamos: Lippi foi severamente atacado com seu filho Davide no escândalo Moggi. Ele era íntimo do ex-dirigente juventino e não são poucas as gravações que o comprometem. Seu filho Davide trabalhava na GEA, o coração do esquema de corrupção montado por Moggi.

Lippi reclamou durante a Copa que Davide estava sendo condenado sem provas e até certo ponto ele tinha razão. Mas o fato é que as perspectivas para pai e filho são perigosas no âmbito de uma investigação e sair dos holofotes foi uma decisão sábia, especialmente porque o treinador não deve ter poucas ofertas para continuar na sua carreira. Isso sem falar que repetir a dose de uma conquista como a de domingo è quase impossível. Não é mesmo, Parreira?

Sem Lippi, a Federcalcio já anunciou que vai atrás de “um monstro sagrado ou um jovem talento”. Como o monstro sagrado assinou com o Real Madrid – Fabio Capello – a entidade deve ir para a segunda opção.

Roberto Donadoni, 42 anos, fez excelente campanha no Livorno até ser demitido pelo presidente do clube, que achava que o time toscano deveria ir à Uefa. Seria a melhor escolha, já que os outros “novos” – Valter Novellino e Cesare Prandelli – dificilmente seriam liberados por seus clubes.

Alberto Zaccheroni, ex-Inter, Milan e Lazio, não é monstro sagrado nem jovem, mas corre por fora, até porque a terceira opção é Cláudio Gentile, técnico da seleção sub-21 e cuja carreira de treinador é incrivelmente mirrada. Não sabe quem ele é? Você lembra de um cara na Copa de 1982, que ficou com a camisa do Zico na mão depois de uma falta no Galinho? Pois é. Era o Gentile…

– Todos os boatos possíveis estão sendo anunciados antes da sentença dos clubes italianos.

– A Juventus invariavelmente perde todos os seus jogadores nas especulações, embora tenha contratado o búlgaro Bojinov por empréstimo, cedendo Mutu à Fiorentina.

– O Milan surge em dois cenários.

– No rebaixado, perde Kaká, Pirlo, Gilardino, Gattuso e Nesta.

– No cenário Série A, contrata Zambrotta, Emerson, Ibrahimovic, Buffon, Zé Roberto e Cannavaro.

– A Fiorentina está em standby, mas nas últimas duas temporadas contratou a níveis interistas.

– E a Inter negocia sim com Luca Toni, Zlatan Ibrahimovic e Emerson.

– Até Materazzi que antes da Copa não tinha vaga nem no terrão agora está cheio de pretendentes…

– Fabio Capello não deixou admiradores na Itália depois que deixou a Juventus apodrecendo no lodo.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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