Atirando no próprio pé

A Inter de Milão não lidera o campeonato. Contudo, ostenta um terceiro lugar que é um retrato fiel de suas possibilidades no momento, atrás de Milan e Juventus. Como já comentamos nesta coluna, a diferença entre a Inter e seus adversários diretos não é em relação ao elenco, mas na rodagem. Capello e Ancelotti têm times muito mais azeitados do que Roberto Mancini, o treinador ‘nerazzurro’.

E se ninguém cria problemas, parece que a própria Inter trata de providenciá-los, tal é o seu apego aos banzés e confusões. Neste final de semana, a Inter esperava enfrentar o Livorno com a moral altíssima e a cabeça leve, especialmente a do atacante brasileiro Adriano, que fez gol pela Seleção Brasileira e é claramente o jogador que a Inter tem como viga mestra.

A tranqüilidade acabou aí. Adriano se atrasou no retorno à Itália, não chegando a tempo de se unir aos companheiros para pegar o time toscano em San Siro. O técnico Mancini ficou muito irritado e o resto do elenco também não viu nenhuma graça na regalia do atacante carioca, que foi obrigado a treinar sozinho em Appiano Gentile enquanto seus colegas liquidavam o Livorno com cinco gols.

Tal confusão já estaria de bom tamanho. Mas daí, Verón, resolveu dar a sua opinião no caso e criticou duramente o comportamento de jogadores “que não respeitavam as regras do grupo”, numa clara alusão ao brasileiro. A declaração foi tão áspera que Verón teve até de falar com o presidente da Inter para assegurar que suas palavras não eram uma crítica ao clube.

O corolário de erros interistas é imenso. Primeiro, errou Adriano em não se apresentar, aumentando a embolorada reputação dos jogadores brasileiros em relação às suas responsabilidades. O atacante não tinha nenhum direito de ‘se dar’ uma folga, nem mesmo que fosse um novo Maradona ou Pelé – o que não é.

Errou a Inter em deixar o assunto vazar e permitir que fulano ou beltrano falassem em nome do clube, dizendo que Adriano estava de castigo, que o técnico estava furioso ou seja lá o que for. A publicidade do caso não trouxe rigorosamente nenhuma vantagem para que a indisciplina fosse resolvida.

Claro, errou Verón que podia ter mantido sua boca bem fechada, especialmente porque precisa da simpatia interista para que seu passe seja comprado do Chelsea. Verón está jogando bem, mas sempre dá a impressão de que está jogando menos do que pode. Na Inter, assim como no Chelsea e no Man Utd, o meia argentino não vale seu salário.

O resultado da presepada é que mesmo tendo jogado muito bem, a Inter tem uma situação absolutamente dispensável para gerenciar, com seu principal jogador (que é cobiçado pelos maiores clubes da Europa e tem como agente o ex-goleiro Gilmar Rinaldi) envolvido num mal-estar.

Cassano x Roma: fratura exposta

Ok, não é uma novidade explícita: Cassano e a Roma romperam oficialmente. A diretora do clube, Rosella Sensi, anunciou na sexta passada que o clube não negociará mais a renovação de contrato com o atacante pugliese. A Roma estava oferecendo €16 milhões em cinco anos, mas o atacante não aceitou.

Não é novidade porque Cassano vem acenando há meses que só renovaria com a Roma se recebesse o mesmo que Francesco Totti, (quase €5 milhões anuais), enquanto o clube deixou claro que Totti, capitão e símbolo romanista, é uma exceção à regra. Fim de papo. Será?

Parece que sim. O diretor de futebol do clube já admite que a Roma aceitará propostas para ceder o atacante em janeiro, caso elas sejam vantajosas. E diante de perder um atleta por zero euros, bem pouca coisa pode não parecer vantajosa, especialmente levando-se em conta que o clube de Trigoria desembolsou €35 milhões há quatro anos para tirar o jogador do Bari.

Os candidatos mais fortes não estão fazendo muito barulho. Milan e Juventus não escondem que gostariam de ver Cassano em seus times, especialmente se ele chegasse de graça. A Inter, claro, demonstra interesse, mas como qualquer criatura viva no futebol com mais de 12 e menos de 60 anos parece fazer parte da lista de contratações interista, a candidatura ‘nerazzurra’ parece infundada, até porque o clube tem mais atacantes do que usa.

O trunfo juventino é Fabio Capello, técnico com quem Cassano garante ter excelente relacionamento. O jogador tem um potencial técnico impressionante, mas ainda não conseguiu serenidade para ser contínuo. No Milan, o ambiente sólido e a ambição européia (além do bolso sem fundo de Silvio Berlusconi) são os atrativos para um jogador que quer dinheiro. Muito.

E na rodada…

Inter, Juventus e Milan conseguiram três pontos na rodada. Cada qual a seu modo. Cinismo juventino, raiva interista e recuperação milanista. De qualquer forma, a Juve continua na frente e ainda 100% com sete rodadas, o que não é nada fácil para o Italiano.

Num momento em que tudo apontava para uma hegemonia completa da dupla Trezeguet-Ibrahimovic, o capitão Del Piero ressurge com excelentes performances, sendo o carro-chefe de uma Juventus ‘modelo Chelsea’: eficiente mas sem graça. Capello tem uma defesa excelente, além do meio-campo super cantado em prosa e verso. A especialidade do técnico é mesmo esta: acúmulo de pontos no começo para gerenciamento quando a produtividade cai.

O segundo colocado Milan não é fantástico como seu elenco poderia sugerir, mas começa a dar sinais encorajantes. A defesa começa a parecer engrenada e o rendimento físico está em crescimento. O time ainda sofre nos últimos vinte minutos de jogo (quase não marca gols no período), mas aprendeu a se fechar quando as pernas não ajudam. Visivelmente a preparação física objetiva atrasar o auge do rendimento para o fim da temporada, evitando tragédias como a de Istambul.

A Inter mostrou que pode vencer sem Adriano, jogando de forma excelente, mas contra um adversário desarticulado por uma expulsão, e além disso, azedou o relacionamento no elenco – fato certamente mais trabalhoso de se recuperar. Vencer jogos contra times menores, em San Siro, não é problema para a Inter nos últimos anos. A prova de fogo interista é a de somar pontos contra adversários diretos.

Outros destaques para as vitórias de Reggina e Udinese, que dão um alento para seus objetivos. A Reggina,até vencer sua primeira partida (exatamente contra a Udinese), parecia conformada com o rebaixamento, mas recuperou sua força dentro do Granillo. E a Udinese agradece ao fato de ter desfeito a burrice de tirar Iaquinta do elenco. O atacante é um dos mais em forma na Itália, no momento, e pode levar o time para a fase seguinte da Liga dos Campeões.

– É realmente estranho o atraso de Adriano na sua apresentação; o brasileiro é um jogador extremamente disciplinado e não é dado a irresponsabilidades.

– Estaria algum clube cheio do dinheiro a orientar a repentina ‘rebeldia’ do jogador?

– Serginho e Vogel, ‘estreantes’, agradaram muito o técnico Carlo Ancelotti contra o Cagliari.

– Vogel porque fez sua primeira partida eficiente, distribuindo o jogo e absorvendo mecanismos defensivos que ainda não sabia.

– E Serginho, ‘estreante’, porque foi escalado para jogar na lateral-esquerda, e se saiu muito bem, defendendo de forma aceitável e criando uma ótima opção pela esquerda.

– O Parma pode perder o defensor Bonera até o final deste ano.

– O jogador sofreu uma lesão muscular contra o Treviso.

– Seleção Trivela da 7ª rodada:

– Peruzzi (Lazio); Tosto (Ascoli), Dellafioe (Treviso) e Materazzi (Iner); Biondini (Reggina), Simplicio (Parma), Cozza (Reggina) e Zauri (Lazio); Amauri (Chievo), Tavano (Empoli) e Iaquinta (Udinese).

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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