Segurando a ponta

A derrota dos campeões europeus para o Deportivo la Coruña, a semana passada, não foi só um resultado chocante. Foi também uma pancada no moral de um elenco que já se acreditava semi-finalista. O Milan era favorito para a conquista, CONTANTO que não subestimasse os adversários. O Depor jogou tudo, o Milan nada, e 4 a 0 foi justo. O drama, então, passava a ser a Série A. Mas quão grande é a crise milanista?

Falar em crise já é exagero. O Milan vinha de duas semanas com dois jogos em cada uma (onde empatou com Modena e Chievo, além de eliminar o Sparta e destroçar o Deportivo em Milão). Some-se a isso os jogos das seleções, que levaram praticamente todo o time titular do Milan para longas viagens, dando direito, inclusive, a um Shevchenko sem dois dentes.

Resultado: o estresse físico, mais o cansaço psicológico de uma temporada que já ultrapassou os sessenta jogos, e mais a sensação nítida que os espanhóis eram carta fora do baralho causaram um desastre, tão grande, que até Nesta e Maldini, a melhor dupla de zaga da Europa, jogou como uma dupla de peladeiros.

Voltando à Série A: o Milan precisava bater o Empoli. Teoricamente, uma baba, afinal eram os campeões da Europa contra um time que está para ser rebaixado. Só que o mesmo Empoli já tinha dado uma trabalheira danada no primeiro turno (jogo decidido com uma invenção de Kaká), além de ter batido, no mesmo estádio Giuseppe Meazza, a Inter, semanas atrás. E todo o ‘background’ físico e psicológico já descrito.

O Milan venceu, mas com um gol de pênalti, a quatro minutos do final. A vitória foi merecida, pois o time de Carlo Ancelotti atacou do início ao fim e Dida quase não viu a bola. O preço foi um adicional de desgaste físico e psicológico. Quanto isso vai custar ao elenco é que é a dúvida.

A “vantagem” de ter saído da Liga dos Campeões é que, se o Milan vai deixar de receber pelo menos US$ 20 milhões, pelo menos poderá treinar durante toda a semana, diminuindo o desgaste. Filippo Inzaghi está visivelmente fora de forma, assim como Serginho; Pancaro está exausto, mas Ancelotti ainda não tem Kaladze. Kaká também parece ter iniciado a descendente física, depois de praticamente um ano e meio jogando a níveis inacreditáveis, sem férias.

O caminho mais crível para Ancelotti é o de recuperar Kaladze, dar ritmo de jogo a Inzaghi e Simic, dar espaço a Ambrosini e Rui Costa, fazendo descansar Gattuso e Kaká, e chegar na partida contra a Roma com pelo menos seis pontos de vantagem (já descontado o derby romano interrompido). Mais importante do que treinar, até o fim do torneio, é recuperar energias. O torneio ainda está completamente nas mãos dos milanistas, e por ora, só um milagre salva Roma ou Juve.

Lippi e Juventus próximos do divórcio?

Se você perguntasse a Marcello Lippi, técnico da Juventus, há dois meses, qual era o seu destino na próxima temporada, ele responderia: “Tenho contrato até 2005, e pretendo cumpri-lo”. Na semana passada, pela primeira vez, questionado sobre o mesmo assunto, respondeu: “Meu futuro? É um assunto sobre o qual falaremos logo, agora não é o momento, mas lhes farei uma bela surpresa”, disse Lippi à Gazzetta Dello Sport, deixando os jornalistas setoristas do clube de Turim em polvorosa.

Vamos por partes: a única coisa certa no episódio é que o técnico de Viareggio já sabe o que fará depois de junho de 2004. Ele segue na Juve? Não é impossível, mas tudo leva a crer que seu futuro está na seleção italiana.

Até poucos meses atrás, imaginava-se que Lippi seria um sério candidato ao posto de Giovanni Trapattoni na “Azzurra” no caso do escrete italiano fazer feio na Eurocopa. Contudo, estaria já circulando uma possibilidade conciliatória: ‘Trap’ passa a ser coordenador técnico, enquanto Lippi assume o comando do time. Mais ou menos o que Zagallo e Parreira faziam em 1994 (sim porque hoje, o cargo de Zagallo é muito mais simbólico do que naquela época).

Se Trappatoni aceitasse esta alternativa, tudo estaria bem para todos. Marcello Lippi poderia comandar a Itália, um seu sonho confesso, a Juventus poderia arrumar outro treinador, depois de uma temporada decepcionante, Trapattoni continuaria na esfera de poder do ‘calcio’ italiano. Lindo.

Os indicadores para uma saída de Lippi da Juve ficaram mais intensos, depois que ele admitiu que tem conversado bastante ao telefone com Didier Deschamps, técnico do Monaco semi-finalista da Liga dos Campeões, e preferido da diretoria ‘bianconera’ para o cargo. Além de Deschamps, outros nomes como Luigi Del Neri (Chievo), Cesare Prandelli (Parma) e Gianluca Vialli (atualmente sem clube), também soam como opções plausíveis.

Assim como sua permanência na Juventus não seria uma surpresa, também não seria chocante se Lippi decidisse passar a próxima temporada descansando, ou quem sabe, até, se aposentasse (vale lembrar que ele disse que se não vencesse a Liga dos Campeões desta temporada, penduraria a chuteira).

Quem será o melhor da Série A?

Ainda faltam cinco rodadas para o término do campeonato, mas já é possível fazer suposições sobre quem será o melhor jogador do torneio. A avaliação é normalmente feita através das notas concedidas pela Gazzetta Dello Sport ao longo das 34 rodadas. E quem você acha que são os prediletos?

Pois bem: se a Série A terminasse hoje, haveria um empate técnico entre Francesco Totti (Roma) e Alessandro Nesta (Milan), e em terceiro lugar estaria o veterano genial, Roberto Baggio, do Brescia.

A avaliação é justa. Totti é a Roma, quase sozinho. Há outros grandes jogadores, como Samuel, Cassano e Chivu, mas foram pouquíssimas as partidas em que a Roma jogou bem e venceu, nesta temporada, sem o seu capitão. Totti não só arma as jogadas, mas também arremata (é o artilheiro do time, com 16 gols), e dá segurança para todos os seus colegas.

No Milan, Nesta não é tão indispensável quanto Totti, mas consegue a proeza de se impor entre os melhores do campeonato, jogando na defesa, o que é quase um milagre. O zagueiro é completo, sob todos os aspectos, marca e desarma bem, além de excepcional posicionamento e cabeceio. Outra coisa: Nesta é o único defensor a figurar entre os dez melhores jogadores, segundo a lista da Gazzetta.

A surpresa fica para Roberto Baggio. Não se imagina que um jogador de 37 anos consiga ficar entre os três melhores da liga mais difícil do mundo. Baggio consegue. Mas não é só. O faz enchendo os olhos do público bresciano, fazendo assistências milimétricas e gols sensacionais. Isso para não mencionar a marca ultrapassada de 200 gols na Série A.

Nomes que estiveram muito bem na temporada passada, como Nedved, Maldini e Vieri, ainda estão muito bem, mas com menos regularidade. Nedved teve um começo de temporada ainda arrasador, mas ficou exausto, como tinha de acontecer uma hora; com Maldini, a temporada é muito boa, mas não assombrosa como a anterior, e Vieri paga o preço de estar num clube tão desorganizado quanto a Inter.

Ainda na lista dos melhores, figuram De Rossi e Emerson (Roma), Pirlo e Shevchenko (Milan), e dois atacantes que certamente serão alvos de transações entre os clubes: Gilardino (Parma) e Chevantón (Lecce).

Curtas

Caso Cláudio Ranieri seja demitido do Chelsea, pode acabar treinando um time da Itália

Muito se fala da saída de Roberto Mancini da Lazio, e nesse caso, Ranieri encabeça a lista

Claro, desde que não queira ganhar um salário “abramovichesco”

Vamos à seção “caça-boatos”

Astros da Itália que podem acabar em outros campeonatos (mas podem mesmo!)

Trezeguet (Juventus), Vieri (Inter), Samuel e Emerson (Roma), Cláudio López (Lazio) e Rui Costa (Milan)

Astros da Itália que só saem por verbas irreais (tipo a que tirou Zidane da Juventus)

Seedorf e Tomasson (Milan), Nedved (Juventus), Totti e Cassano (Roma)

Jogadores cuja “possível transação” é balela

Pirlo, Shevchenko e Kaká (Milan), Del Piero e Buffon (Juventus), Adriano (Inter)

Só por curiosidade: Maldini entrou em campo com seu filho, Christian, que já joga nas divisões de base do clube e promete ser a terceira geração da família em Milanello (foto)

Esta é a seleção Trivela da 29ª rodada, no Campeonato Italiano

Pelizzoli (Roma); Ferrari (Parma), Bonera (Parma), Bertotto (Udinese) e Bettarini (Sampdoria); Camoranesi (Juventus), Jankulovski (Udinese), Pirlo (Milan); Gilardino (Parma), Baggio (Brescia) e Iaquinta (Udinese)

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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