Eu não entendo como alguém (que não seja madridista ou santista, bem entendido) consiga torcer contra o Barcelona. Suponho que seja uma espécie de ressentimento atávico. Afinal, a maioria de nós jamais verá nosso time do coração jogar um décimo do que joga este Barça em sua plenitude (mesmo que 90% dos torcedores consiga se enganar que “aquele grande time do *time para qual torço* era melhor que este Barcelona”). Com ressentimento ou não, ver o Barça cair é triste e até certo ponto, compreeensível, mas absolutamente insignificante em termos históricos. O Barcelona é o melhor time do mundo, o melhor de sua geração e tem grandes chances de vir a ser o melhor de todos os tempos, dependendo de como forem geridos os próximos anos. Essa derrota não muda nada no que diz respeito à história.
Depois de três anos jogando quase ininterruptamente (porque além de ter de disputar todas as competições possíveis, ainda há os amistosos disputados pelo mundo ávido de grená) e cedendo jogadores para as competições entre seleções (que atingem praticamente todo o elenco do clube), o Barça finalmente caiu e é lógico que caísse uma hora. Não há atleta que consiga permanecer 12 meses atuando no ápice de sua performance. Os sobrehumanos Messi, Xavi, Iniesta, Piqué e Dani Alves têm performances assombrosas há pelo menos três anos. Isso se não contarmos que os espanhois do time já voavam baixo na temporada anterior, quando a Espanha deixou de ser o time que “jogava como nunca, e perdia como sempre”, conquistando merecidamente a Eurocopa em 2008. Uma hora, a fadiga física e mental haveriam de dobrar esse time mágico – e essa hora chegou.
Além do cansaço, há a superexposição. Não há um treinador no mundo (mesmo os médíocres “professores” brasileiros) que não tenha, ainda que secretamente, a sua “fórmula” para parar o Barcelona. E depois de tanto tentar, já com um Barcelona a meio-pau, fisica e mentalmente, Mourinho e o (provavelmente medíocre) Di Matteo descobriram que é preciso perder a vergonha e jogar como um time inferior, muito inferior para ter chance de peitar os campeões europeus. Mourinho já sabia disso na Inter, onde na semifinal da LC de dois anos atrás, montou a maior retranca de toda a história (reprisada ontem pelo Chelsea) para parar um time que era indizivelmente melhor. No seu primeiro ano de Real Madrid, acreditou que poderia jogar de igual para igual e foi trucidado sistematicamente. No confronto do último fim de semana, jogou como se fosse a Olhanense. E o Barça sucumbiu.
Ao contrário dos puristas, não acho que o sucesso de Real e Chelsea tenha sido “menor” ou “roubado” ou outro eufemismo pejorativo. Torcedores e críticos (especialmente quando vêem seus times derrotados), tendem a vociferar como se a vitória através de uma defesa sólida, quase renunciando ao ataque, seja desleal, baixa, ou errada. É um reflexo de quem não entende a noção básica do esporte de que ambas as equipes têm iguais chances, a priori, de vencer. Contra um adversário muito mais forte, todos os recursos admitidos pela regra do jogo são igualmente lícitos. O mumunho “Mas ele ganhou jogando na retranca” é coisa de mau perdedor. Se Real e Chelsea tivessem abusado da violência com a conivência dos árbitros, seria ilegal. Só jogar com uma postura defensivista ao extremo não tem nada de errado. Sendo o Barcelona o prodígio que é, tem a obrigação de encontrar um antídoto para a retranca xiita que o derrotou na LC de dois anos atrás e nos dois últimos jogos. É a obrigação dos mitos. A derrota para um time inferior é ainda mais dolorida, mas se Golias perdeu para David, a culpa foi sua.
Além disso, há Messi. O gênio que a Argentina doou para o mundo há de amadurecer muito mais com a derrota do que teria com mais um sucesso. E Messi precisa amadurecer para poder conseguir o sucesso com sua pífia seleção. Messi precisa conquistar a única coisa de Maradona na qual não é melhor do que o Pibe, que é a liderança e autoconfiança exacerbadas, típicas dos jogadores que conseguiram conquistas além de seus próprios limites. Messi precisa de um título mundial com a Argentina e só ele pode fazer algo a respeito – porque a Argentina não fará nada para ajudá-lo.
Além da definição dos títulos, contudo, a eliminação do Barcelona não representa muito para a história. Ninguém lembra com fascinação (além dos portistas, claro) do “épico” Porto de Mourinho campeão europeu em 2004 nem do “fabuloso” Bayern de Munique campeão em 2001. Esses times foram campeões, com méritos, mas venceram com o suor de operários e só. Não eram times brilhantes nem memoráveis.Os times de Real Madrid e Chelsea, se forem lembrados pela história, serão por terem derrotado o Barcelona (mais uma vez, claro, exceto para seus fãs). Muito da beleza do futebol está no jogo em si e não no resultado. Pena que para notar isso, é preciso se distanciar. Uma distância que o torcedor nunca tem.

Obrigado,. minha cara. Abs
Não dá para condenar porque torcer é um ato irracional, Gustavo. Nem quando se trata de um sacrilégio. abs
Outro post excelente, Cassiano. Parabéns. Triste é ver jovens e habilidosos jogadores, meias e atacantes brasileiros torcendo pelo twitter pra esse Chelsea ou contra o Barça. Não consigo entender.
Não sei quem é. Faz parte do tipo de jornalismo que abordo no post seguinte, sobre o legado de Guardiola. Há pouco mais a dizer. abs
Torço para o Bayern e para que os times neorricos sempre se explodam. abs
Imagine se a Olhanense tivese Ozil e Cristiano Ronaldo. 😉 abs
Grande texto, só achei que você exagerou ao dizer que o Real Madrid jogou como a Olhanense no último clássico. O Real foi superior de forma honesta, como você disse, não tentando enfrentar o Barcelona de peito aberto – perderia de novo se fosse assim – mas também não mais insistindo na bobagem dos três volantes, que faziam com que o time se descontrolasse à toa e acarretasse em expulsões e novo massacre. Essa situação cansou de acontecer na última temporada. O Real Madrid jogou com inteligência, mas objetividade nos momentos cruciais. Özil foi muito bem, particularmente. De resto, ótimo texto. Abs!
Ah…vc escreveu! hahaha. Concordo com tudo e eu ja imaginava o desgaste fisico do Barça na temporada passada pq as principais peças não tiveram férias por terem servido a Espanha no Mundial de 2010. No entanto colocaram em xeque meu insight. Lá em cima no inicio, eu torci contra o Barça sobre tudo quando Milan e Chelsea o enfrentaram no intuito de torcer pelo ‘azarão’ pelo mais fraco mesmo (no caso do Milan e vc sabe que acho que gosto mais do Milan do que do time para o qual torcia no Brasil, pq não acompanho mais futebol brasileiro). E há quem veja o belo no ‘catennacio’ de Di Matteo, que derrotou o Barça. A derrota faz parte do jogo e devemos ressaltar que nunca percebemos arrogancia, ‘salto alto’ ou superioridade da parte do Barcelona seus atlétas e comissão técnica nos últimos anos.
Otimo texto Cassiano!
Logico que eu tava torcendo contra o barça ontem e fiquei arrasada com a eliminação do real hoje. Achava que iriamos conseguir. E jogamos tão mal o segundo tempo. Eu teria colocado os batedores de penalti em outra ordem.
Acho que o barça devia ter arriscado mais de fora de área. Eles tavam sempre lá mas quase nunca chutavam de fora da área. Até eu que tava torcendo contra fiquei agoniada.
Torço pela Chelsea na final!;3
Abraços e continue escrevendo que é otimo!=)
Cassiano, off topic agora:
quem vc vai torcer para que fature a UCL? Bayern ou Chelsea?
Eu particularmente gostaria que o Chelsea ganhasse, acho que Drogba, Lampard, Cech e Ramires merecem, são grandes jogadores. Também poderá ser a chance de redenção do Terry depois do trágico penalti de 2008…
Mas acho que o Bayern tem ampla vantagem pela final ser em Munique.
Enfim, a sorte está lançada, continue postando aqui no site…
DANIEL
Cassiano e aí, tudo bem?
Que bom mais uma vez ver um texto seu, já sentia falta.
Concordo plenamente com tudo o que escreveu. Não dá pra torcer contra o Barça, principalmente depois da Ucl de 2011, que o Barça deu show de futebol arte sobre o United. O Barcelona já vinha jogando de forma brilhante e já está com o seu nome na história, era o time a ser batido, natural que acontecesse algum desgaste físico e psicológico após isso.
Também concordo plenamente que enfrentar o Barça com retranca não é indigno, seria indigno se ocorresse violência, mas acho que a violência que teve foi observada e punida pelos juízes. Inter e Chelsea usaram de retrancas, mas não foram desleais, e os lances isolados foram punidos.
Agora, uma impressão que tive do Barça, e não sei se vc também teve essa mesma sensação, é a de que o Barça tem um elenco raso. Os titulares são craques indiscutíveis, mas faltam reservas de qualidade e um bom centroavante. Para enfrentar retrancas, o jogo aéreo e o chute de fora da área são essenciais, e isso o Barça não teve em seu elenco, acho que foi uma falha de montagem neste sentido. Todavia, acho que a base deve ser mantida. Manteria todos os craques do Barça atuais, mas contrataria urgentemente um bom centroavante e um meia que saiba chutar de longe, além de mais zagueiros. Acho que com Vucinic, ou a volta de Eto’o, e contratando Jovetic o Barça fica mais perfeito ainda.
No mais, é bola pra frente, Guardiola precisa motivar bem os jogadores para a final da copa do Rei e recomeçar 2012/2013, que tem tudo para ser um ano de sucesso.
DANIEL
Cassiano, por favor, o que voce acha desse comentário?
http://www.ricaperrone.com.br/2012/04/voce-pra-mim-e-problema-seu/
Discordo, Gilson. Acho que o que derrotou o Barça foi o estresse físico e mental depois de três anos de saciedade. Aposto que férias bem tiradas farão milagres pelo time. Isso, se não aparecer ninguém como mais um Neymar, por exemplo..abs
Espero que a “derrota” de ontem sirva para uma reflexão interna sobre os limites do Barça. Mesmo sabendo que o forte é o toque de bola, e isso não deve mudar, em alguns momentos é preciso lançar alguém no jogo que possua características minimamente diferentes.
É um pouco triste perceber que Keita e, no final da partida, Puyol estavam na área do Chelsea para tentar fazer o papel de pivô.
Aliás, no quesito banco de reservas é impressionante a diferença entre o Real, que pode se dar ao luxo de colocar Kaká e Higuaín na reserva, e o Barça, que está bem longe disso.
E uns dois defensores de melhor qualidade não seria uma má ideia. Creio que dentre aqueles “melhores times da história” o atual Barça deve ter disparadamente a pior defesa.
Vamos ver como será a composição do elenco para a próxima temporada.
Aí é um sacrilégio. Maradona foi tecnicamente muito mais encantador do que Messi. Alem disso dava respostas positivas em circunstancias adversas (Napoli e Argentina-86). Entendo que alguns jornalistas por não gostarem do Diego como pessoa, acabam misturando as coisas e tentam diminui-lo como jogador de futebol.
Maradona com 16 anos e espinhas na cara levou o Argentinos Jr. ao topo do campeonato argentino numa época onde o campeonato argentino era 200 vezes mais sujo e hostil do que hoje, e ainda não havia o êxodo, os melhores argentinos jogavam lá. As entradas que o Maradona sofria dos marcadores na época fazem as que Neymar sofre parecerem puro fair-play.
Depois de Garrincha em 58 e 62, o Maradona foi o jogador mais desequilibrante dentro de uma Copa. E olha que ele jogou por uma seleção medíocre, com exceção do Ruggeri lá atrás. As gerações posteriores com Verón, Simeone, Batistuta etc eram muito superiores ao time de 86. No Napoli não preciso nem dizer o que ele fez neh..
Messi é objetivo, mas só é um fenomeno jogando no quintal de casa, quando joga numa equipe menos entrosada e menos talentosa, não tem culhões pra dar uma resposta. Por enquanto ele só pode ser comparado a Di Stefano, que jogava por um timaço, fazia mtos gols, mas nada épico.
Valeu, Regis! Abração.
Fato. Conhecø peo menos três.
Obrigado, Vitor. E volte sempre. 🙂
O Barça se tornará o melhor time da história quando superar essa “””crise””” e conseguir renovar seu estilo de jogo para superar essas retrancas.
No mais, ótima análise dos fatos.
A quantidade de santistas que devem ter gritado “chupa Messi” depois que o rosarino perdeu o pênalti não deve estar no gibi.
Cassiano, simplesmente perfeito. Análise fantástica, da realidade, sem distorção de fatos. Parabéns.