O Fausto da Vila

Os leitores deste espaço sabem que eu acho que Neymar já deveria ter sido vendido. Não é segredo. A indisposição de Ganso com o clube e a saída da precoce promessa Jean Carlos Chera da Vila já são consequências da permanência do atacante, uma vez que claramente abriu-se um precedente. Amigos santistas mais que respeitáveis falam em favor da permanência de Neymar e da lisura do presidente do clube, Luis Álvaro. Mas eu discordo da primeira e cada vez mais desconfio da segunda.

Neymar não tem mais a cabeça no Santos há tempos. Ele sabe que será vendido e que ficará ainda mais rico. Cabe descobrir o valor do contrato e quando isso vai acontecer. O Santos ganhará dinheiro na transação (embora já haja uma série de intermediários que tenham fatias seguras no processo), mas o problema que criou para si só se avoluma. Depois do divórcio anunciado de Ganso, também perdeu uma promessa que já tinha sido aliciada de um clube paranaense, Jean Carlos Chera. Todos os jogadores da base santista sonham em emular a história – e especialmente os ganhos – de Neymar. O precedente está posto e esperar que os outros meninos da base não se comparem a Neymar é um argumento frágil – ainda que seja simples constatar que não há jogadores tão dotados tecnicamente por aí.

A proximidade do Santos com empresários de futebol traz ao clube problemas de maneiras sistemáticas (especialmente quando alguns deles têm uma reputação duvidosa). A iniciativa de Luis Álvaro de autorizar Neymar a ficar na Inglaterra jantando com empresários certamente não ajuda a criar a ideia de que quem mande no Santos seja o próprio clube. Menos ainda a proximidade de uma CBF que só está utilizando o clube num jogo político e envolvendo o Peixe num ambiente de absoluta promiscuidade ética, na qual a concentração da seleção de futebol mais famosa do mundo serve como coxo para a refeição de empresários.

Luis Álvaro age como Fausto, personagem do folclore alemã (cuja versão mais famosa é a do escritor Goethe) que vendeu sua alma ao diabo na ilusão de um poder efêmero e inconsistente. O Santos segue a realpolitik do futebol, imaginando que haverá de sobrar um espaço para si na divisão do poder entre os inescrupulosos. Basta olhar a história para ver que os poderosos não tem solidariedade para tanto. E quanto mais tempo passar, pior vai ficar.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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