Dois Corinthians

Hoje existem dois Corinthians

O primeiro é o que sempre esteve aí. Tem um estádio acanhado (mas tem) no Parque São Jorge, uma torcida alucinadamente apaixonada (mas manipulada mediaticamente) e uma tradição antiga: a de ter dois ou três grandes jogadores no elenco e oito cabeças-de-bagre que comem grama. Os rivais do Corinthians sabem que essa fórmula é a que dá medo.

Esse Corinthians é treinado pelo Mano Menezes. Tem alguns jogadores interessantes como André Santos, Dentinho e Elias e vários jogadores muito limitados, como Cristian, Alessandro e Wellington Saci, que se fossem jogar em outro clube, com a técnica que tem, no máximo estariam num Paraná Clube (com todo o respeito), no Fortaleza ou no Juventude. Mas no Corinthians, são outra coisa.

E existe um outro Corinthians. Ele se chama Ronaldo.

Hoje, o Corinthians passou a ser o time de Ronaldo, e não o contrário. No mundo inteiro, pouca gente conhece o Corinthians, mas nas últimas semanas, passou a conhecer.

O primeiro Corinthians vai, no máximo, lutar por uma vaga na Libertadores. Isso se mandar muito bem. Se se desdobrar – como costuma fazer quando tem a fórmula dois bons jogadores + oito dando a alma. O segundo Corinthians luta pelo título brasileiro, artilharia do campeonato e vaga na Copa de 2010. E arrasta o primeiro Corinthians junto.

Quando Ronaldo se contundiu no Milan, comentaristas de TV e rádio cravaram, no mesmo dia: “sua carreira acabou”. Na época, escrevi no antigo site no qual trabalhava (e fundei), que essas pessoas eram oportunistas, irresponsáveis e ignorantes. Houve quem reagisse à minha resposta – os oportunistas, irresponsáveis e ignorantes, claro. Imbecis que avaliavam a contusão de um jogador a 5mil km de distância, sem nenhum conhecimento médico (às vezes até com conhecimento médico, mas com a ética de um traficante de drogas). Os oportunistas, irresponsáveis e ignorantes, agora, incensam Ronaldo como um craque fora de série, que ele nunca deixou de ser.

Mas há um problema: ele – Ronaldo – ainda tem uma situação clínica complexa. Não pode jogar com a mesma sequencia que um jogador comum. Sua capacidade de se recuperar da fadiga causada pelos jogos é muito menor que a normal e isso não é uma observação nele (porque não sou médico nem vi seus exames), e sim, a regra para qualquer atleta com histórico de lesões.

O primeiro Corinthians sabe que precisa do segundo ou está fadado a ter de diminuir suas metas. E está arriscando ao fazer Ronaldo jogar mais e mais. É uma aposta. Especialmente porque o atacante não quer deixar de aproveitar a volta do sucesso. Da tutela de Ronaldo depende o sucesso do Corinthians. É como a galinha dos ovos de ouro: a pressa e a ambição podem colocar tudo a perder.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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