O que pode e o que não será

Não falta gente que ache que o Santos seja um time tão bom quanto o Real Madrid (especialmente entre os que acreditam que o Santos é oito vezes campeão brasileiro). Claro que não pode se tratar de uma avaliação objetiva, mas em futebol, exigir objetividade é quase a mesma coisa que exigir decência dos políticos. Ainda assim, cabe lembrar aos empolgados que, neste ano, o Real Madrid enfrentou o Barça sete vezes e venceu uma. Domingo pode trazer um título ao Santos – sim, pode, porque no futebol, tudo pode acontecer – mas nada tirará do Barça o lugar de melhor time do mundo.

Antes da final da Liga dos Campeões, Tostão, com muita propriedade, disse: “A decisão servirá para ver quem fica com a taça, porque o melhor time da Europa é o Barcelona“. Na decisão de Yokohama, é mais ou menos a mesma coisa. O Santos se inspira em Davi para tentar bater um Golias que é o antônimo do gigante opressor e sim um absoluto defensor do futebol mais puro e bem jogado. Madridistas e cristianorronaldistas estão ainda levantando no seu baú de negações os argumentos para explicar o show de futebol do Barça num jogo em que os catalães não estavam no melhor de sua forma. Messi, Valdés, Piqué, Puyol, Fàbregas e Xavi jogaram bem aquém do que podiam – o que já é uma enormidade. E Iniesta fez chover uma, duas trinta vezes.

A chance do Santos está em quanto o Barcelona está ligando para o jogo. Em condições normais, estaria dando considerável importância, o que, diante da vivência de vida e morte santista, poderia colocar o Peixe com boas chances de conseguir uma vitória (assim como o São Paulo fez com o Liverpool e o Internacional fez com o próprio Barcelona). O ponto é que com o hype desproporcional em cima de Neymar, há boas chances de que o Barcelona esteja mesmo vendo a partida com  a atenção que dá aos seus grandes jogos. Se for esse o caso, só uma série de lesões pode impedir que o jogo termine com uma goleada. Não há um time no mundo capaz de jogar de igual para igual com o Barcelona, nem entre os melhores e o Santos, não está entre os melhores. Hoje dá para dizer que esse Barça é um dos melhores times de todos os tempos, mas só quando ele se desfizer é que poderemos dizer quanto ele se aproxima do melhor time de todos os tempos.

Mas há Neymar. Não escondo que acho o endeusamento de um moleque imberbe uma insânia gerada pela necessidade de audiência e espaço para patrocinadores. Neymar é, visivelmente muito acima da média, mas ainda tem só 19 anos e seu comportamento confirma isso. Na final da Libertadores passada, ele deu uma mostra – a primeira, ao meu ver – da maturidade que se exige de um jogador como ele. Em Yokohama, terá a chance de dar outra – essa, absolutamente mais relevante que a primeira e também mais difícil, ainda que, para os gigantes, não há tarefas difíceis e sim, glórias maiores.

A uma semana do jogo, escrevo que caso o Santos ganhe, seremos intoxicados por uma crítica completamente pachequiana, mas que terá algum tipo de sentido. O Santos prepara-se para enfrentar um time incrível, daqueles que, como o Santos de Pelé, o Ajax de Cruyff e o Milan de van Basten, arregimentava tanto os torcedores dos times como de rivais, tal era a beleza de seus jogos. Vencer esse Barça, ainda que num calendário idiota, ainda que num jogo só, ainda que num torneio mal-organizado, é uma tarefa mítica.  Contudo, assim como o Inter de Abel não era melhor que o Barcelona, que o Vélez de Chilavert não era melhor do que a Juventus e como o São Paulo de Autuori não era melhor que o Liverpool, esse Barça continuará sendo melhor que o Santos. Só que para delírio insano dos santistas, com uma taça a menos. O resto é conversa para vender jornal e paixão desenfreada.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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