Ajax em busca do tempo perdido

Não chega a ser uma revolução, mas o Ajax passa por mudanças. Cansado de seu papel periférico no futebol europeu, o time de Amsterdam ainda não almeja retornar à glória impossível de um tricampeonato europeu. Mas sabe que perder títulos para AZ e Twente significa que algo está realmente errado e precisa mudar.

Em 2008, Marco van Basten foi escolhido para estabelecer uma “revolução” administrativa e esportiva no clube. Uri Coronel, então recém-nomeado presidente, fez um relatório de tudo o que estava errado e deu novas diretrizes ao Ajax. Johan Cruyff estava acertado para fazer parte da diretoria, mas na última hora, decidiu não se envolver alegando que só participaria se as mudanças fossem completas.

Pelo que se viu nos últimos três anos, ainda que tenha havido uma melhora notável, Cruyff tinha razão e o clube não recuperou sua força. Agora, Coronel prepara uma outra alteração que já começara a se desenhar há mais ou menos dois meses quando o conselho do clube passou a incluir ex-jogadores, entre os quais uma série de aliados de Cruyff. O desenrolar esperado aconteceu e o mítico holandês encerrou o hiato de 22 anos fora do Ajax e agora faz parte do comitê técnico do Conselho, ao lado de outro grande ex-jogador, Piet Keizer.

Outro indício de mudança profunda foi a demissão do chefe de observadores do clube, Hans van der Zee. Van Der Zee deveria ter tido seu salário elevado em 40% em julho, mas foi demitido sumariamente pelo diretor geral Rik van den Boog. O clube se absteve de dar maiores explicações, mas a demissão teria sido um resultado de irregularidades nas contratações. Das 11 contratações feitas na gestão do técnico Dick Jol em parceria com van den Zee, somente duas (Demy De Zeeuw e Mounir El Hamdaoui) teriam seguido o protocolo estabelecido pelo ‘Relatório Coronel’. Relatórios técnicos das observações não teriam sido feitos e nomes contratados teriam chegado ao elenco sem que houvesse o procedimento agora adotado pelo clube.

Em resumo: o relatório se deu conta de que jogadores vinham sendo contratados por interesse de agentes com conivência de funcionários do Ajax. Por isso, criou-se um protocolo no qual para que muita gente fosse envolvida no processo, dificultando a possibilidade de corrupção ou mau uso do dinheiro (imaginem se uma moda dessas pega no Corinthians e seus 130 jogadores contratados nos últimos 30 meses).

Conversei com um colega jornalista que acompanha muito o que ocorre no Ajax. Segundo ele, Cruyff quer o clube seguindo sua filosofia completamente, como faz o Barcelona. Só que, segundo meu colega, o Ajax não tem dinheiro nem tamanho para tanto. Contudo, por mais que Cruyff tenha um temperamento desagradável com uma certa frequência, eu sou um grande admirador da firmeza com que ele defende seus princípios. Talvez o Ajax não tenha como ser o Barcelona, mas acho que seguir a mesma filosofia do Barça só pode dar em alguma coisa boa.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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