Corrigindo o erro na hora errada

No ano passado, quando Muricy assumiu o Palmeiras, eu tinha uma sensação de que aquela não era a coisa certa a se fazer: Muricy estava magoado com o São Paulo e buscava vingança, os diretores que o contrataram se preocupavam mais com a reação no Morumbi que com o time e a pressão da torcida seria dobrada, pois viria de São Paulo e Palmeiras. Era uma aposta errada, mas não mais do que a em Antônio Carlos.

Não é preciso ser adivinho que a crise no Palmeiras é criada, gerada e acalentada no Conselho. O clube tem um histórico de esquizofrenia dirigencial, onde os conselheiros se engalfinham por qualquer farelo de poder e a oposição se não é sempre maior do que a situação, consegue amalgamar a própria força de maneira exemplarmente rápida e eficiente, perdendo tal característica quando chega ao poder. A fênix é sempre do contra e não desiste nunca.

O Palmeiras demitiu um treinador que ainda não provou sua capacidade num clube médio ou pequeno, tem um elenco desequilibrado e desunido, uma parceira que trata o time como Juan Figer tratava o Rentistas (time de aluguel no Uruguai), dá poder demais a empresários e a conselheiros, que súbita e momentaneamente saem de sua mediocridade e obscuridade naturais para fagulhas de luz graças a algo ridículo do tipo um cargo “diretor de piscinas” ou algo assim. O elenco tem líderes com poder demais e diretores/membros da comissão técnica com poder de menos. Receita para o desastre.

Antonio Carlos foi bem demitido à medida que é a aniquilação de uma ideia errada. O problema é que maio não é um mês para se fazer isso. Eventualmente com a Copa do Mundo, talvez possa ser, porque o novo técnico tem de rearrumar a casa, tanto em termos físicos quanto táticos e técnicos.

O pedido por Felipão é óbvio por conta do status de Messias que ele tem no Palmeiras, mas o clube de hoje está a léguas do multicampeão da Parmalat. Politicamente, aquele era uma ditadura de Mustafá Contursi, enquanto este não é – é um caos dirigencial. Havia dinheiro e uma parceira paciente. Este tem uma parceira que investe em quem quer e vende assim que o lucro bate os R$1000. Havia elenco e havia – principalmente – paz. Não preciso dizer que não há mais.

Nada dará certo no Palmeiras enquanto o conselho não se arrumar entre pessoas que pensem no clube ao invés do poder que podem ter para ganhar um ingresso grátis no próximo show do Palestra. Nada dará certo enquanto o time não der as cartas à parceira e não o oposto. Nada dará certo enquanto o técnico não tiver carta branca para tirar do elenco quem quiser – Marcos incluso – caso haja indisciplina. Não se trata de competência nem de tradição. se trata de lógica. Hoje, o Palestra jaz em cima de um alicerce de papelão e lama.

Nesse cenário, a contratação de Scolari faz sentido se ele vier por um valor reduzido, para não dilapidar o cofre do clube. Essa conversa de que “time grande tem de pensar em time grande” é um discurso batido quando se trata de ir além das próprias possibilidades. Um time grande é grande em tradição e torcida – isso não muda. No que tange à grana para contratações, um time grande pode ser pequeno momentaneamente sim. Isso está longe de ser vergonha. Juventus e Milan são dois exemplos claros de clubes que se reestruturarão em 2010.

Arrotar o caviar de 1900 é burrice para quem tem mortadela saindo pela boca. Ou seja: Scolari é uma saída que alivia a pressão na diretoria, mas não a melhor, já que o clube terá de pagar esse esforço extra em algum momento – algo que, mais cedo ou mais tarde, o Corinthians terá de fazer, depois de ter montado um time mediático e caro para um sonho brancaleônico da Libertadores. O dinheiro não nasce em árvores. Ele vira dívida e essa sim, se multiplica como um vírus. Se os conselheiros palmeirenses pensassem no clube, fariam um armistício na estúpida batalha interna para que o clube conseguisse se reequilibrar. É mais fácil que da noite para o dia, Ricardo Teixeira doe todo o dinheiro da CBF para a caridade e transforme a entidade numa sociedade com presidente eleito pelo voto direto da população.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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