O maior do Brasil

Ontem, ao chegar em casa, pude ver o finalzinho do Tá na Área, apresentado pelo ótimo Marcelo Barreto. A bola da vez era o clamor popular pelo futebol do sérvio Dejan Petkovic, autor dos dois gols contra o Palmeiras no domingo. As torcidas – a do Flamengo em especial – aclamavam o sérvio como um cracaço, o “melhor jogador do futebol brasileiro”.

Torcidas à parte, mantenhamos a calma: Petkovic é o “melhor jogador do futebol brasileiro”? O mesmo Petkovic que flopou no Santos, Goiás e Atlético-MG? Será que estamos falando do mesmo jogador ou, por desinformação, um novo balcânico baixou no Rio e eu, culpadamente, não estou sabendo?

Uma olhada rápida na carreira do sérvio: passagens por Real Madrid (8 jogos), Sevilla (5) e Racing Santander (8) na Espanha e Venezia (13), com um ano em cada time e três gols no cômputo geral. Além disso, no exterior, o meia jogou na Arábia Saudita (zero jogos pelo Al Ittihad) e China (22 jogos e 7 gols pelo Shanghai Shenhua). No currículo, cinco estaduais, uma “Copa dos Campeões” (aberração esportiva da CBF para dar uma vaga para a Libertadores), uma Copa do Nordeste, dois campeonatos iugoslavos e um espanhol (este último, no banco).

Até acho que a última sequencia do sérvio tem sido mesmo boa – mas boa para o futebol que o Flamengo jogava recentemente e até para o equilíbrio deste Brasileiro. Não consigo, sinceramente, acreditar que alguém ache que o Petkovic de hoje seja melhor do que Diego Souza, Cleiton Xavier, Gilberto, Hernanes, D’Alessandro e mais pelo menos duas dezenas de jogadores do atual campeonato, ressaltando que essa lista de 20 e poucos nomes teria jogadores bem questionáveis.

Eu compreendo que Flamengo e Corinthians tenham um poder e espaço mediático devastador e que lampejos de futebol na Gávea ou Parque São Jorge tenham um efeito muito maior do que um ótimo futebol na Vila Belmiro, na Toca da Raposa ou na Arena da Baixada. Prova disso eram os pedidos por um Ronaldo em forma inaceitável na Seleção. O torcedor pode tudo, mas o jornalista que se dispuser a enaltecer o futebol de Petkovic como se estivesse vendo Puskas no auge, depois de uma sequencia de dez bons resultados do Flamengo, não pode estar falando sério.

Vou partir do princípio que os “pedidos” pelo meia na Seleção Brasileira sejam piadas, por razões óbvias (tanto pela qualidade dos jogadores quanto pelo fato de Pet já ter jogado pela Iugoslávia). Mesmo as conjecturas de a seleção sérvia ter o meia são risíveis. Os sérvios conseguiram a vaga no grupo da França com certa facilidade, e têm ótimos jogadores no setor como Stankovic (Inter de Milão), Kacar (Hertha Berlin), Tosic (Manchester United) e Kuzmanovic (Stuttgart), todos jogando em grandes clubes da Europa, algo que Petkovic jamais fez, nem em seu melhor momento. Quanto à comparação com seus colegas brasileiros, me parece que vários deles despertem interesse em clubes importantes do exterior, o que me parece, também não é o caso do sérvio.

Petkovic nunca foi um mau jogador, mas tampouco um craque sensacional. É extremamente técnico e inteligente, é verdade, mas participa pouco do jogo de equipe (tradução: não marca ne corre). Se tiver a mesma liberdade que os jogadores de armação tinham nos anos 70, de fato pode fazer a diferença – exatamente o erro tolo e infantil que Muricy e Ricardo Gomes cometeram ao enfrentar o Flamengo. Dizer que Petkovic é o melhor jogador do Brasil é uma sandice, uma daquelas que a imprensa adora (porque vende jornal e porque faz oba oba com um time popular). E se essa sandice vira uma unanimidade, ressuscitemos Nelson Rodrigues: “Toda unanimidade é burra”.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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