Maradona, o ex

Acabei de ler o blog de Juca Kfouri na Folha, onde ele critica Maradona pelo seu comportamento grosseiro com a imprensa depois da classificação para a Copa do Mundo. Mas acho que Juca foi gentil demais.

Diego Maradona pode ser o maior jogador argentino de todos os tempos, mas é pouquíssimo além disso. Há uma simpatia que ele causa junto a parte da imprensa numa suposta contraposição entre sua “rebeldia” e o alinhamento sistemático de Pelé, seu grande “rival” com o establishment do futebol.

Explicando as aspas para o fato de Pelé ser “rival” de Maradona. “Rival”, nesse caso, só pode vir entre aspas porque qualquer comparação entre os dois é fora de propósito, para se dizer o mínimo. Pelé conseguiu absolutamente todas as glórias que o futebol poderia dar a um jogador, enquanto Maradona conquistou algumas delas. A força de Maradona na “competição” com Pelé se dá porque sua aposentadoria foi há menos tempo e é mais rica em imagens. Só isso. Uma comparação pertinente seria a de equiparar Ademir da Guia a Diego Souza na história do Palmeiras, ou Zico com Adriano na história do Flamengo.

As aspas em “rebeldia” para Diego se explicam porque os atos de transgressão feitos pelo ex-jogador são fruto só de um desvio de personalidade, uma necessidade de chamar a atenção típica dos filhinhos ricos de milionários que repentinamente tomam consciência de sua mediocridade indiscutível. Maradona jogador era um gênio, mas esse Maradona morreu. O Maradona atual se mostrou medíocre em todas as tentativas de adotar outra carreira. Sua “irreverência” é pouco além de uma falta de educação somada à arrogância.

Ao assumir o cargo de treinador, Maradona aceitou misturar seu nome ao conluio demagógico da federação argentina para saciar sua sede quase psicótica de atenção. Por pouquíssimo não deixou de fora da Copa um elenco que, bem arrumado, pode lutar de igual para igual com as melhores seleções do mundo. Seu conhecimento tático é nulo, mas é bem maior do que suas noções de preparação física e treinamento e além disso, Maradona se comportou como um egoísta menor ao escalar ou sacar jogadores porque era ou não amigo deles , sempre pondo sua seleção em risco para atender ao seu ego doentio.

Nesta altura, é bom ressaltar a importância de Maradona no conluio demagógico do qual ele fez parte – algo que contraria sua suposta “coragem” contra o sistema. A Argentina não tem uma seleção firme há pelo menos oito anos. Não se classificou para a fase final do Mundial Sub-20 e não gera um craque incontestável sabe-se lá desde quando (Lionel Messi, vale lembrar, precisou ir para o Barça para aparecer). O campeonato está um lixo, com os times falidos a ponto de olharem os brasileiros com inveja. É com esse panorama que Maradona compactuou.

Classificada, a Argentina pode voltar a ter admiradores de seu técnico. Há de ter alguém que diga que “Maradona classificou a Argentina para a Copa do Mundo”, e que evoque seu passado glorioso ou sua “rebeldia” em seu favor. Contudo, o máximo que Maradona tem capacidade de ser hoje é ex-jogador, função para a qual nenhuma virtude é necessária de antemão, a não ser o passado.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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