Um caso estranho

O debate entre futebol “alegre” (seja lá o que for isso) e futebol “de resultados” é, para mim, um dos menos inteligentes, aprazíveis e pertinentes que acontecem tantos nas mesas de bar quanto na mídia (embora as duas coisas sejam quase iguais em inúmeros casos). Sendo direto: é um debate burro, ilógico. É a mesma coisa que “concordar” ou não que feijoada é melhor do que pizza, como se isso fosse possível.

Há casos, por exemplo, onde o time que lidera e ganha campeonatos se esmera muito mais na aplicação tática do que na técnica. Exemplo: o Chelsea de José Mourinho. Verdade: não havia espaço para presepadas robinhísticas como dribles na lateral ou tentativas de lances de Winning Eleven, mas a inteligência na disposição dos times, a elevação da marcação, o aperfeiçoamento da parte física também tinham seu valor. É uma questão de gosto – mas só quando se vence. “Nunca nenhum torcedor me pediu futebol bonito – sempre me pedem títulos”, dizia o técnico Hector Cúper.

A Inter de Milão, contudo, desafia a lógica: não joga bonito, não é eficiente mas ganha e lidera o Italiano com seis pontos de vantagem. Maicon, Stankovic, Cambiasso, Ibrahimovic e mais recentemente, Adriano, vêm jogando bem – muito bem. Mas o resto do time é um arremedo. O gol sofrido diante do Torino é um bom exemplo. A marcação interista é falha, a zaga não acerta o posicionamento e raramente a Inter encontra um formato de jogo. Mas ganha. E lidera. O que ocorre?

Primeiro, é preciso atestar a incompetência de Juventus, Roma e Milan. Os três tropeçam nas próprias pernas. A Juve é extremamente sólida, mas sofre de blecautes tático-mentais de vez; em quando; a Roma não consegue – ainda – jogar sem Totti e sofre a ausência de Mancini; o Milan paga o preço de contratações estelares ótimas em prejuízo das necessárias de carregadores de piano com menos de 760 anos.
Analisando a Inter, por si só, a liderança se explica no talento individual. Ações individuais de Maicon, Stankovic e Ibra iniciam a maioria esmagadora dos gols do time (além de Julio Cruz, que é uma espécie de amuleto zagalliano do clube). Sem eles, nem com o rigor defensivo de Mourinho nem a falta de competência da concorrência a Inter comandaria.

Até quando? Por pior que seja, a Inter é a melhor até agora. Ganha os pontos que tem que ganhar. Além disso, tem um grande potencial de melhora, especialmente no ataque. As defesas de Mourinho jogam bem mais cedo ou mais tarde, ainda que ele tenha de contratar alguém de confiança da época do União de Leiria. E se esses reforços vierem, é na zaga “milanísticamente” velha (Cordoba, Burdisso, Materazzi, Samuel) que o português vai se precaver.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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