E o que sobrou?

Pela primeira vez desde a penúltima rodada da última Série A, o futebol italiano teve uma semana de relativa tranquilidade, uma vez que as sentenças definitivas parecem ter sido dadas. Parecem, porque ainda cabem os recursos na Justiça Esportiva (especialmente para dirigentes traqueteiros se safarem) e a Justiça Comum. Mas os primeiros não alterarão a fisionomia do próximo campeonato e a última é improvável, já que condenaria a Itália a perder todas as suas vagas européias por punição da Uefa.

E o que é tranquilidade? Uma sensação estranha de um país que acabou de comemorar uma conquista de Copa do Mundo, mas não consegue ficar feliz. Nem mesmo a Inter, maior “beneficiada” com o escândalo – já que deve arrancar reforços da Juventus, além do ‘scudetto’ – tira da cara o sorriso amarelo de um país envergonhado.

A sombra incômoda do vexame não deve serivir nem mesmo para uma reformulação completa na estrutura do futebol italiano, que é tão necessária. As figuras centrais continuarão as mesmas e, exceção feita a Luciano e Alessandro Moggi e Antonio Giraudo, muito pouco vai mudar. A fama de desrespeito à lei que a Itália tem na Europa está ganhando um excelente reforço.

No ambiente clubístico, com a Juventus for a por um ano, Inter e Roma assumem papéis de destaque e tentarão se capitalizar para a volta da rival. O Milan, que foi envolvido perifericamente, teve um duro golpe na imagem, e muito provavelmente deve fazer ao menos duas contratações de peso para a política do “pão e circo”: os juventinos Gianluigi Buffon e Zlatan Ibrahimovic.

O que restará do famoso mês de junho de 2006? Além das remodelações nas Séries A e B da Itália (veja na seção ‘Palonetto’), um imenso dano para a imagem do esporte. Um jornalista italianodisse, esta semana, em entrevista ao ‘Sport Observer’, da Inglaterra: “Quando o dinheiro entrou pela janela do futebol italiano, o esporte saiu pela porta”. A frase não é original, mas poucas vezes foi tão verdadeira.

Análise da temporada

Nas próximas quatro semanas, você terá aqui na Trivela a análise dos 20 times da série A. É bom lembrar que o mercado de jogadores ainda está efervescente e alterações profundas podem acontecer. Por isso, os cinco clubes mais ricos (Milan, Inter, Roma, Fiorentina e Palermo) serão deixados para a última semana, uma vez que são os mais sujeitos a novas transações. E pela primeira vez na história, não teremos a Juventus entre os times da série A, mas uma análise especial será feita depois que a série B começar.

Ascoli

Estádio: Cino e Lillo de Luca (28.430 lugares)
Técnico: Attilio Tesser (novo).
Estrela: Pagliuca (Bologna)
Fique de olho: N’Siabamfumu (meio-campista).
Quem chegou: P. Zanetti (Empoli), Pagliuca, (Bologna), Paolucci (Juventus), Foglio (Siena), Bjelanovic (Genoa), Pecchia (Bologna), Fontana (Napoli), Lukovic (Udinese), Ghidini (Chieti), Guarna (Lanciano), Bocchetti (Lanciano), Gaeta (Ancona), Vastola (Salernitana), Ascenzi (Manfredonia), Amodeo (Igea Virtus), Tosto (Empoli), Ciotti (Pro Vasto), Corallo (Cremonese), Boudianski (Avellino), N’Siabamfumu (Rennes), Minieri (Avellino), Pecorari (Lecce), Nastase (Bologna).
Quem saiu: Quagliarella (Udinese), Schumacher (Udinese), Budan (Parma), Cordova (Livorno), Zotti (Roma), Comotto (Roma), Foggia (Milan), Domizzi (Sampdoria), Paci (Genoa), Coppola (Milan), Guana (Palermo), Parola (Sampdoria), Carbone (Chievo), Cariello (Chievo), C. Del Grosso (Giulianova), Cordova (Messina).
Pretensão: evitar o rebaixamento.

No começo da temporada passada não houve muita gente disposta a acreditar nas chances do Ascoli – inclusive esta coluna. Para surpresa geral, o pequeno time marchegiano conseguiu uma permanência tranquila na primeira divisão, graças àquele que foi considerado o treinador-revelação da última Série A, Marco Giampaolo.

O problema que o Ascoli enfrentará agora é exatamente a saída de Giampaolo, que foi para Cagliari. Attilio Tesser, seu substituto, não tem um perfil muito diferente, e fará sua primeira temporada na Série A desde o começo (sua estréia foi justamente no Cagliari, no campeonato passado, onde salvou os sardos do rebaixamento). Antes disso, seu currículo tem seis temporadas nas divisões amadoras, série C2 e B.

Se o clube não tem mais a sua estrela no banco, agora conta com uma no gol. O goleiro Pagliuca volta a série A para tentar bater o recorde de presenças de Paolo Maldini. Mas ele não terá vida fácil, com os jovens Goletti e Boccolini na sua sombra. No mais, a defesa do time não deve ter maiores surpresas: quatro em linha e marcação por zona.

As duas esperanças do time vêm de empréstimos da Juventus. No meio-campo, o juventino Boudianski é joven, tem presença física e capacidade de criação. No ataque, Paolucci, é o candidato à vaga de atacante num provável 4-5-1.

Atalanta

Estádio: Atleti Azzurri D’Italia (26.638 lugares)
Técnico: Stefano Colantuono.
Estrela: Andrea Lazzari (meio-campista).
Fique de olho: Daniele Capelli (defensor).
Quem chegou: Carrozzieri Carrozzieri (Sampdoria), Donati (Milan), Innocenti (Messina), Magrin (Monza), Manfredini (Rimini), M. Stendardo (Bellaria), Rinaldi (Udinese).
Quem saiu: Bergamelli (Salernitana), Campisi (Pizzighettone), Consigli (Sambenedettese), D’Agostino (Cagliari), Fabiano (Monza), Filippini (Salernitana), Marcolini (Chievo), Minelli (Catania), Osvaldo (Lecce), Saudati (Empoli), Stucchi (Salernitana), Taibi (Torino), Terra (Arezzo).
Pretensão: evitar o rebaixamento.

A Atalanta volta à Série A, como sempre, com um time baseado em jogadores italianos. Na verdade, exceção feita ao brasileiro Adriano (ex-Grêmio), todo o elenco atalantino até a presente data é formado por italianos, com a maioria deles vindo das divisões de base do clube, um feito raro na Europa.

Stefano Colantuono não fez uma campanha sensacional no ano passado, mas sempre manteve seu time perto da região de promoção. Só que seu currículo é bastante impressionante. Em cinco temporadas como treinador (Sambenedettese, Catania, Perugia e Atalanta), ele já conseguiu duas promoções, além de colocações finais nas 4ª, 5ª, e 9ª posições.

A Atalanta de Colantuono fez seus amistosos de pré-temporada jogando num 4-4-2 tradicional. O promissor Capelli faz dupla de zaga com Rinaldi, com ox experientes Manfredini (não se trata do mesmo Manfredini de Lazio e Chievo) e Innocenti nas laterais. O meio-campo é bastante pegador e joga sempre em função de contra-ataques. Bernardini é normalmente o mediano, e os outros jogadores se alteram, com destaque para o bom Lazzari, que pode atuar como ala ou ponta.

O ataque atalantino é bastante sólido. Zampagna é o ponto fixo, e sabe como brigar com zagueiros fortes; com mais mobilidade, Colantuono usa Ventola e Soncin. A Atalanta depende muito de seus jogadores ‘caseiros’. Se a safra é boa, o time vai bem. Asenão, cai. Deve ser assim mais uma vez nesta temporada.

Cagliari

Estádio: Sant’Elia (39.905 lugares)
Técnico: Marco Giampaolo (novo).
Estrela: Suazo (atacante).
Fique de olho: Canini (defensor)
Quem chegou: Fortin (Siena), Penalba (Quilmes – ARG), Pepe (Palermo), Coppola (Messina), A. D’Agostino (Treviso), Del Grosso (Ascoli), Semedo (Feirence – POR)
Quem saiu: Gobbi (Fiorentina), Abeijón (fim de contrato), Bega (Genoa).
Pretensão: evitar o rebaixamento.

O Cagliari volta à Série A depois de uma temporada irregular, em muito atrapalhada pelo seu presidente, Massimo Cellino, que jamais deu segurança para treinador e elenco, fazendo fantasias irreais a respeito do potencial sardo. Mesmo assim, o Cagliari teve uma revelação em Suazo (22 gols em 37 jogos), Esposito (que vestiu consistentemente a camisa da seleção) e Canini, defensor entre os jovens mais cobiçados da Itália.

O maior reforço do clube é o treinador Marco Giampaolo, que surpreendeu a todos no Ascoli. Em sua sexta temporada como treinador, Giampaolo inicia pela segunda vez a Série A, sabendo que terá a pentelhação de Cellino nas suas costas. Mesmo assim, a aposta nele é boa.

O Cagliari não teve uma defesa espetacular na última temporada (55 gols sofridos), mas tem um ótimo goleiro, Chimenti (ex-Roma e Juventus), que deve poder comandar um setor rejuvenescido e fortalecido pela capacidade do técnico. A chave para uma boa temporada do time do Sant’Elia passa pela recuperação da defesa.

No meio, Conticchio e Budel são os encarregados de gerenciar a partida, com Conti e Pani como opções válidas. Os dois devem jogar com mais um homem na sobra e com Esposito encostando no ataque quando tem a posse de bola. Na frente, Suazo é o destaque, com Cocco e o ex-romanista Simone Pepe como jogadores para se prestar atenção. Todas as premissas para uma temporada tranquila estão colocadas. Isso, se o presidente não atrapalhar.

Catania

Estádio: Angelo Massimino (26.806 lugares)
Técnico: Pasquale Marino.
Estrela: Giuseppe Mascara (atacante)
Fique de olho: Takayuki Morimoto (atacante)
Quem chegou: Corona (Catanzaro), Edusei (Sampdoria), Plasmati (Andria), Minelli (Atalanta), Morimoto (Tokyo Verdy – JAP), Sardo (Piacenza), Millesi (Avellino), Izco (San Telmo – ARG).
Quem saiu: De Zerbi (Napoli), Brevi (Siena), Paschetta e Lo Monaco (Gallipoli), Patanè (Juve Stabia), Romano (Juve Stabia).
Pretensão: evitar o rebaixamento.

Se fosse possível colocar a verdadeira ambição do Catania para esta temporada, seria algo como “evitar o rebaixamento e olhe lá”. O clube não investiu um rio de dinheiro, não era um dos favoritos para o acesso e não tem nenhum nome que possa sustentar uma campanha tranquila na Série A.

Com uma campanha de reforços baseada em nomes vindo de clubes menores (como Corona, do falido Catanzaro), o Catania precisará mais do que nunca de sua fanática torcida – uma das mais dedicadas da Itália – para lotar o Massimino e botar pressão nos rivais.

Os nomes chave para o técnico Pasquale Marino serão o volante Edusei, o meia-atacante Mascara e o armador Baiocco. Se os três estiverem em sincronia com o time e vice-versa, o Catania pode arrebanhar os pontos necessários para se garantir. Se não encontrar uma formacão sólida rapidamente, é candidatíssimo para voltar à Série B.

Chievo

Estádio: Marc’Antonio Bentegodi (42.160 lugares).
Técnico: Giuseppe Pillon.
Estrela: sergio Pelissier (atacante).
Fique de olho: Victor Nsofor Obinna (atacante).
Quem chegou: Girardi (Benevento), Carbone (Ascoli), Cariello (Ascoli), Marchese (Catania), Garzon (Cremonese), Antonelli (Messina), Bruno (Brescia), Succi (Ravenna), De Paula Marcos (Martina) Silva Reis (Bellaria), Sicignano (Lecce), Marcolini (Atalanta).
Quem saiu: Fontana (Palermo), Franceschini (Sampdoria).
Pretensão: vaga em competição européia.

Depois de ganhar as manchetes em sua primeira temporada na Série A, em 2001, o Chievo finalmente chegou a uma vaga na Liga dos Campeões. Certamente se trata de um marco para um clube que se move muito bem no mercado, não faz dívidas para contratar medalhões e normalmente consegue mostrar excelente futebol, mantendo seus técnicos.

Giuseppe Pillon chegou com tal condição a Verona e mostrou serviço. Mesmo que a Juventus não tivesse perdido sua vaga com o ‘calciocaos’, o Chievo teria conseguido, confortavelmente, uma vaga na Copa Uefa, o que não é pouco para um clube com tão pouco tempo de Série A, sem um dono bilionário nem uma torcida gigantesca.

Desde a gestão de Luigi Del Neri no Chievo, o clube joga preferencialmente num 4-4-2 tradicionalíssimo, com quatro jogadores na defesa que fazem linha de impedimento, marcação por zona, laterais cautelosos e alas rápidos. Para a próxima temporada, muito pouco deve mudar.

Lann, Mandelli e Moro têm sido pontos fixos na defesa (o primeiro, desde a Série C). o clube contratou o bom goleiro Sicignano junto ao Lecce, e deve ter a ajuda de bons meio-campistas, como Brighi e Franceschini, na marcação. As jogadas ofensivas ficam a cargo de Semioli (se este não for vendido para um clube maior) e Luciano ‘ex-Eriberto’.

A dupla de ataque do Chievo certamente terá muita qualidade. Pelissier e Amauri são os titulares, mas o nigeriano Obinna tem tudo para ser a sensação da temporada, com um estilo de jogo bem característico dos nigerianos, com grande técnica e muita força física.

O Chievo tem ótimas perspestivas para esta temporada, especialmente porque mantém praticamente toda a base titular, o que tem sido o segredo de seu sucesso. O time de Pillon deve continuar sendo dificílimo de bater no Bentegodi e uma vaga européia é mais do que viável.

– Estas são as formações das novas séries A e B na Itália.

– Entre parênteses, as punições em pontos que as equipes sofrerão.

– A punição da Triestina não tem a ver com o escândalo.

– Ascoli, Atalanta, Cagliari, Catania, Chievo, Empoli, Fiorentina (-19), Inter, Lazio (-11), Livorno, Messina, Milan (-8), Palermo, Parma, Reggina, Roma, Sampdoria, Siena, Torino, Udinese.

– Albinoleffe, Arezzo, Bari, Bologna, Brescia, Cesena, Crotone, Frosinone, Genoa, Juventus (-17), Lecce, Mantova, Modena, Napoli, Pescara, Piacenza, Rimini, Spezia, Treviso, Triestina (-1), Verona, Vicenza.

– Ibrahimovic já fechou com o Milan, que agora negocia com a Juventus sobre seu passe.

– Até Carlo Ancelotti, treinador do clube, já admite que sua chegada é “provável”.

– Ancelotti falou em tom otimista até mesmo de Ronaldinho.

– Todos em Turim garantem que Buffon fica, mas tudo indica que ele vai mesmo para Milão.

– A Juve já negocia com Ameliam do Livorno, o que não é exatamente um indício da permanência de Buffon.

– Outro nome fortemente cotado para a Juve é o do atacante Bianchi, da Reggina.

– A Inter negocia com Vieira, Trezeguet e Ibrahimovic (Juventus), Toni e Jimenez (Fiorentina).

– Só que o volante francês quer o Manchester United, destinação também atraente para a Juve, que não cederia o jogadro para uma rival.

– O negócio só não foi fechado ainda porque a proposta da Inter para Vieira é muito maior do que a inglesa.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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