Se se esconde, não é craque

A definição de “craque” não é precisa. Normalmente, se banaliza o termo referindo-se como “Craque” a qualquer jogador que tenha uma técnica acima da média – como Neymar, por exemplo. Mas eu discordo. Para mim, ao craque, não basta ter uma técnica acima da média. É preciso também ter uma personalidade que permita a ele decidir as partidas difíceis. Se ele se esconde, não é craque.

O Milan jogou bem contra o Tottenham. Merecia vencer a partida, com toda certeza. Talvez não merecesse se classificar, dada a má apresentação do jogo de ida em San Siro, mas em Londres, merecia vencer. Um jogo difícil e equilibrado demandava que um dos jogadores tecnicamente mais refinados chamasse para si a responsabilidade. Foi exatamente o que faltou a Ibrahimovic, Pato e Robinho – indiscutivelmente, três dos jogadores com técnica mais apurada na Itália. Mas não – pelo menos não ainda – craques.

Eu teimo em não considerar muita gente como sendo craque que na imprensa já tem cetro e coroa. Cristiano Ronaldo, Neymar, Robinho, Diego, Ibrahimovic, são alguns deles. O degrau que falta a eles é o de decidirem partidas difíceis com tudo jogando contra. Dos citados, Neymar é o único que ainda não teve uma chance à altura (embora no Sulamericano Sub-20 – não exatamente uma Copa do Mundo – tenha fracassado na única partida realmente decisiva). Todos os outros fraquejaram quando precisavam validar o talento que têm.

No confronto do Milan, Ibrahimovic se apagou. Tinha feito o mesmo pelo Barcelona contra a Inter na temporada passada. E pela Inter na temporada anterior, bem como por Juventus e Ajax antes disso. É difícil contestar. O sueco é tecnicamente um monstro, equiparável aos melhores do mundo. Mas não merece a mesma coroa de Messi, que já passou por Kaká, Ronaldinho Gaúcho, Zidane. Craques decidem jogos sozinhos. Jogadores bons e ótimos só dão shows quando não tem a Espada de Dâmocles sobre suas cabeças. Num campeonato de pontos corridos, Ibra é imbatível (haja visto os sete títulos nacionais consecutivos) porque sabe que se jogar mal, pode compensar nas próximas rodadas. No mata-mata, ele treme.

Talvez seja por isso que eu acredito que alguns jogadores até menos dotados tecnicamente do que Neymares e Ibrahimovics sejam craques. Sneijder e Kaká são dois exemplos. Talvez não sejam os melhores na hora de dar dribles e fazer brincadeiras com a bola, mas com ela em campo num jogo duro, chamam a responsabilidade para si e crescem como gigantes. Também são exemplos Steven Gerrard, Andrés Iniesta e por aí afora.

O Milan esperava que Ibrahimovic decidisse a partida contra o Tottenham, assim como também tinha fé em Pato e um pouco menos – mas tinha – em Robinho. Só que nenhum dos três conseguiu subir o degrau final. Um psicólogo poderia fazer maravilhas por jogadores assim (e certamente ajudaria Neymar a desabrochar como poderia). Times bons podem jogar como times bons, mas, para vencer times superiores, precisam de craques, precisam de coelhos sendo tirados da cartola, mesmo que não por gênios malabaristas. Os craques marcam seus nomes na história a ferro e fogo. Os ótimos jogadores só o fazem se tiverem craques por perto.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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