Dunga aumenta a pressão II

Depois que se conhece o ambiente de um time de futebol profissional, é fácil entender por que os grandes treinadores são disciplinadores militares. Num elenco, quando a autoridade começa a ser questionada pelas costas, o rendimento cai. Ou se tem o grupo 100% na mão – por admiração ou medo – ou é ruína na certa. Por isso, acho que os técnicos que enquadram jogadores e/ou imprensa, estão no seu direito. Mas Dunga está sendo, na minha opinião, apenas burro ao partir para a briga com jornalistas de maneira tão ostensiva.

A autosuficiência de Dunga é filha da impunidade de Ricardo Teixeira. O número 1 da CBF faz o que quer. Tira cidades e estádios da Copa do Mundo como se ela fosse dele que, investido de poder por um esquema viciado, manda e desmanda no futebol brasileiro e todos os que poderiam impedi-lo – governo, imprensa, jogadores – calam-se ou censuram-se mais ou menos por interesse próprio. Essa cumplicidade deve custar aos cofres públicos paulistanos o bilhão de reais que será queimado em um estádio inútil.

Dunga vê Teixeira onipotente e com os sucessos esportivos que ele vem acumulando, está colocando as mangas de fora, xingando jornalistas, proibindo entrevistas, fechando treinos e tirando sarro abertamente da corte que segue a Seleção. Dunga não se recuperou nem jamais vai se recuperar do que sofreu após a derrota de 1990. A mágoa é o motor e a sensação de impunidade teixeiro-cebeefiana é a ferramenta de seu desequilíbrio psicológico visível. Comparações com Maradona são pertinentes até certo ponto. Maradona é um viciado em exposição e até outro dia era um dependente químico assumido. Dunga é simplesmente rancoroso, apoiado numa condição momentânea de onipotência.

Se a Globo teve o espaço que teve em 2006 e ajudou a levar a Copa para o desastre, a culpa foi de Ricardo Teixeira, mas a emissora não o atacou por isso. Atacou Parreira, o elofraco da cadeia, o bode expiatório conveniente. Assim como jornalistas da emissora, ainda hoje, jamais dizem um “a” sobre Teixeira por conta de uma manobra diplomática até compreensível para quem tem os interesses que a Globo tem em relação ao futebol brasileiro e da Seleção – mesmo quando Teixeira se comporta de maneira absolutamente inaceitável. Embora a emissora seja frequentemente a mais criticada pela sua postura “cebefista”, não é a única a demonstrar cordialidade sistêmica com a entidade. Um jornalista, em especial, que ataca nominalmente Carlos Alberto Parreira e poupa Teixeira para manter o bom relacionamento com o dirigente, me nauseia, porque até uma porta sabe que se Parreira foi conivente, não foi ele quem ditou as regras.

Dunga, na sua mágoa infinita e descontrolada, não está tirando deste episódio a lição que deveria tirar. Ele está certo de que pode repetir 1994 e vencer, mais uma vez, seus inimigos supremos, a imprensa. Em caso de derrota, a CBF e Teixeira o jogarão Dunga num vulcão escaldante sendo que o atual treinador da Seleção está se besuntando em gasolina e álcool ao brigar com os jornalistas globais. Ricardo Teixeira não faz segredo que seus aliados são seus aliados enquanto interessa a ele. Sem o Hexa, Dunga passa de “asset” para “Liability” (desculpem os termos em inglês, mas as traduções “ativo” e “passivo” ficam meio perdidas). E como “liability”, será jogado fora. Dunga vai para o tudo ou nada. Ou será campeão ou será crucificado pelos milhares de inimigos, enquanto Ricardo Teixeira observará seu corpo arder ao longe, enquanto prepara uma nova gestão para 2014.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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