Vitórias de Pirro

Ontem fui ao Pacaembu com um amigo santista, a convite dele. Fui esperando um jogo fácil. Pensei nuns 3 a 0 para o Santos. E para minha surpresa, vi um 3 a 2 para o Santo André, vice-campeão por falta de sorte. Vi um jogo inesperado. Vi o Santo André contra um time de talento absurdo para atacar e risível para defender. Não sei até onde o sucesso no Paulista é algo para se comemorar.

É indiscutível que o Santos tem dois jogadores fora de série. Neymar tem um talento assombroso, mas a arrogância de um craque multiconsagrado. Já Ganso é uma promessa completa, fadada ao sucesso estratosférico. Sem ele, o Santos é comum. Tudo passa pelo seu pé e segue seu comando. O resto do time é aceitável para os padrões brasileiros. Robinho? É o atual Neymar dentro de alguns anos: um jogador de recursos infindáveis, mas aburguesado, que se vê como um messias da bola após ter massacrado o Zé Cadela FC.

Quando o Santos pega a bola no campo ofensivo, tem talento de sobra e vocação para o gol. Passa bem, e quando a bola não está com Robinho, não dribla excessivamente e busca a meta sempre – talento raro em atacantes habilidosos. Quando se defende, no entanto, o Santos é um time de quinta divisão. Ao ser expulso, Léo fez sua melhor jogada do dia. Esteve risível. Graças ao desenho desequilibrado de Dorival Jr., Dracena e Durval estão sempre correndo atrás do atacante, seguidos por um heroico Arouca. Os três gols do Santo André saíram em falhas crassas, primárias, de posicionamento santista. Os dois gols do Peixe foram fruto de um talento que brota nos pés de Neymar e Ganso como petróleo na Arábia Saudita.

Nenhum Estadual é medida para alguma coisa. O Santos encarou o torneio como prioritário, mas os adversários de verdade, não. O primeiro jogo importante – mesmo – no ano, foi na quarta passada, uma derrota para o Atlético-MG. Há uma final nesta quarta. Defendendo-se como no domingo, não há chances. Não importa que Neymar, Robinho ou mesmo o espetacular Ganso sejam capazes de desequilibrar. Não existem times que sejam vencedores só atacando ou só defendendo. Pode-se até ser melhor num do que no outro, mas esse Santos não existe defensivamente.

Sei que nado contra a corrente, criticando um time da moda, mas não me incomoda. Não é a primeira vez e faz parte das minhas obrigações. Não posso ficar profetizando o acontecido, como fazem colegas medíocres. É preciso dizer o que se vê ou corre-se o risco de fraudar o leitor.

As torcidas querem seus times campeões. O show é um acessório delicioso, que vira um pecado em caso de derrota. Esse time do Santos foi campeão por acaso, mesmo tendo sido o melhor time do torneio de muitíssimo longe. A bola na trave nos minutos derradeiros poderia ter entrado sem drama. Seria um prêmio à determinação do Santo André, time infinitamente inferior tecnicamente, mas muito, muito melhor montado.

Se o Santos amanhecesse vice, o espetáculo teria todo sido em vão, o que seria uma triste alegoria do que o Brasil foi na sua história até recentemente: um oceano de talento desperdiçado. Esse Santos tem os recursos para ser o Brasil de ontem, perdulário, underachiever, “quase”, ou o Brasil que se desenha na última década, olhando para a frente, com potencial e determinado. O futuro dirá qual o caminho escolhido.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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