Uma grande besteira…mas como condenar?


Kaká acaba de entrar para a história como o jogador pelo qual se pagou a maior quantia em todos os tempos. E é muito provavelmente que nunca mais se volte a pagar cifras similares, porque a economia do mundo está iniciando um processo onde os acúmulos de riqueza indecentes, como os dos milionários russos e dos xeques árabes que vivem com o patrimônio de seus povos, irão rarear.

Do lado do Milan, não há o que falar. Não se trata de uma decisão. Se os italianos não vendessem Kaká por mais de R$ 300 milhões, teriam de ser internados. Não há nenhum jogador que valha isso (como eu disse ontem).

Mesmo sendo quase impossível condenar Kaká por aceitar uma proposta de cerca de R$ 1.7 milhões por semana, é possível atestar: ele, do ponto de vista esportivo, fez uma besteira. Nem o Manchester City, nem nenhum clube muda de status simplesmente com um aporte de dinheiro, por maior que seja ele. Em Manchester, Kaká será herói, é verdade, mas terá sobre si uma cobrança muito maior do que tinha no Milan. Se exigirá dele o que ele não pode dar: a perfeição em todos os jogos.

Hoje, o futebol é um negócio, mas sua natureza faz dele um negócio muito particular. Dinheiro ajuda, mas não define. O Chelsea não é um clube à altura dos grandes europeus e pelo que tudo indica, não o será, porque o verão provocado por Abramovich dá sinais de fadiga. Investimentos em divisões de base, treinadores e profissionais de gabarito são fundamentais, mas só os clubes que criam em torno de si uma aura, que faz daquele clube uma entidade única, conseguem se fixar. Mesmo os jogadores mercenários, quando vão para clubes como Juventus ou Barcelona, têm de se adaptar à entidade, ou então, não ficam.

Ouço dizer também que Robinho também pediu Kléber, lateral do Santos, como contratação para o clube se engrandecer. É curioso observar como o mundo do futebol tem espaço para suas próprias chagas. Kléber, um lateral que teve uma passagem razoável no Corinthians, fracassou retumbantemente na Alemanha e, no Santos, fez pouco mais do que alguns bons jogos, vem sendo convocado à seleção há anos e ainda tem “patrocínio” do “chegado” Robinho para uma tranferência zilionária. Exatamente ele que, diga-se a verdade, teria grande dificuldade para lutar por uma vaga de titular em qualquer um dos cinco primeiros colocados do último Brasileiro.

Kaká ficará muito, muito rico e esse foi o caminho que ele escolheu. Mais do que todos seus colegas. Mas não alcançará no City o sucesso que teria no Milan, Barcelona ou Manchester United. O dinheiro elevará o City, mas o difícil é permanecer no alto. Uma Premier League? Finais européias e eventualmente um título? Talvez. Tradição? Não, nisso eu realmente não acredito.

E finalmente, uma palavra sobre este sheikh árabe. O seu gasto não tem nada a ver com “investimento”. Não é possível ter retorno como negócio num valor deste. Num momento em que palestinos morrem na miséria em Gaza, essa despesa é asquerosa, vil, suja e odiosa. A simples existência de uma pessoa tão rica e tão inconseqüente já causa incômodo. Bem, um de seus assessores é Kia Joorabchian. É preciso dizer mais?

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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