Mais um ano se passou e nada mudou

O futebol italiano está se consolidando como um eterno poço de lama. Isso, você já sabia. Você também pensava que o auge da podridão tinha vindo à tona em maio de 2006, quando explodiu o escândalo de ‘Calciopoli’, onde Luciano Moggi aparecia como o comandante de uma vasta rede de favores e manipulação que se embrenhava por toda a Itália, indo além do futebol. Mas – provavelmente – você e eu pensávamos que tanto escândalo tinha sido suficiente para uma purificação.

Não tinha. Uma nova lista de gravações, revelada pelo diário italiano La Repubblica mostrou que Moggi talvez tenha sumido da mídia, mas não perdeu um centímetro de sua influência dentro do sistema ‘calcio’. Em um relatório de 469 páginas, o ex-dirigente da Juventus aparece falando com gente de quase todo o espectro do esporte na Itália. Ele aparece comentando contratações, dando conselhos (solicitados) a dirigentes de vários clubes, dizendo quem vai ou não vai comprar esse ou aquele clube e até fazendo observações sobre a seleção italiana.

Por exemplo: Moggi fala a um jornalista sobre a renovação de contrato do Milan e dá detalhes sobre como está a renovação de contrato de Dida e diz que contratar Storari é uma grande “merda”. Acerta encontros com dirigentes como Alessio Secco, seu sucessor na Juventus, diz a Spinelli (do Livorno) o que fazer para contratar treinadores e diz ao dono do Torino que tem de gastar menos dinheiro e acertar mais trocas.

Fica claro nas gravações que Moggi aprendeu a lição de ‘Calciopoli’ (ao menos em parte) e deixa o relevante das conversas para encontros pessoais. Fica igualmente indiscutível que sua figura no futebol perdeu status, mas não poder. E como ele está sob uma suspensão de cinco anos, isso, por si só, já é uma irregularidade.

O trailer e os cartazes do filme “Poderoso Chefão III” traziam a seguinte frase: “Poder de verdade não pode ser dado: tem de ser tomado”. As estruturas de poder na Itália são sólidas o suficiente para suportar meras penalidades burocráticas como suspensões e multas. Luciano Moggi é um sintoma de como esse poder continua mandando e resistindo. Daí é fácil concluir a razão pela qual os problemas no ‘Calcio’ (leia-se violência, corrupção e nebulosidade) não se resolvem. A ferida só foi limpa superficialmente. O pus e a infecção estão todos lá ainda.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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