Ano ruim, mas com esperanças

O Milan deve vencer o campeonato e a Inter é favorita para a Copa Itália. Além disso, a Roma tem promessa de vida nova com a chegada de uma nova gestão para o clube (que pode ser uma bênção ou uma maldição). Mesmo assim, o clube que tem mais chances de sair desta temporada com um horizonte é a Juventus – apesar de uma temporada abaixo da crítica. Há razões para isso.

Há cinco anos, na primeira reunião com a diretoria pós-Moggi, a cúpula juventina sabia que teria um futuro traumático e maquiavelicamente, começou a raciocinar. A Itália ainda não era campeã mundial, mas já era favorita para sediar a Eurocopa do ano que vem. Por isso, e sabendo que o clube não conseguiria fazer frente à Inter depois do rebaixamento e sem a grana Liga dos Campeões por pelo menos três anos, a prioridade passou a ser o estádio do clube – construído com investimentos próprios e não com assaltos aos cofres públicos como os que levantarão estádios no Brasil. Parte dos custos do estádio poderiam ser abatidos com a Eurocopa, mas esta não aconteceu e o ônus da construção foi maior do que o esperado.

O plano incluía investimentos pesados no retorno à Série A, que mesmo sem a Eurocopa, foram feitos – Diego, Felipe Mello, Quagliarella, Bonucci, Amauri, Krasic. Esperava-se que à época da conclusão do estádio, a Juve estivesse ao menos voltando a disputar títulos e com um treinador bem assentado – que era para ser Didier Deschamps, um juventino ad hoc. Contudo, o plano foi por água abaixo depois que Deschamps brigou com o ex-presidente Blanc e subsequentemente, os outros treinadores tiveram vida dura em função do binômio lesões-eminências pardas.

A reversão do problema foi igualmente prejudicada por entreveros. Luigi Delneri foi o escolhido para montar uma Juventus com uma cara bem italiana (4-4-2 em linha, laterais mais fixos, dois medianos que ditavam o jogo, ataques a partir dos externos, etc), e havia os ingredientes para isso nesta temporada. Contudo, Delneri bateu de frente com Buffon, Del Piero e Amauri desde que chegou ao clube. Independentemente das qualidades que ele pudesse ter, sua passagem já estava em xeque desde o início.

Sua briga com Buffon se alastrou para a diretoria e por causa disso, o agente de Buffon, Silvano Martina, já avisou que o goleiro deixa o clube em junho. Ele tem uma proposta do Manchester United, mas não quer submeter a família a morar em Manchester e por isso, cogita Londres, onde o Arsenal também tem interesse. A proteção da diretoria a Delneri não resistiu à campanha obscura e o treinador deve voltar ou à Atalanta ou à Sampdoria, enquanto a Juventus deve ser comandada por Francesco Guidolin (curiosidade: Guidolin tinha sido escolhido por Moggi para suceder Lippi, mas sua contratação foi cancelada quando Moggi conseguiu convencer Fabio Capello a ir a Turim) ou Antonio Conte, ex-capitão juventino. Curiosamente, Buffon e Delneri acertaram suas diferenças e hoje estão convivendo bem, mas o relacionamento do goleiro de Carrara com a diretoria foi danificado.

Contudo, o plano juventino de reconstrução segue firme, pois o cerne de tudo é o novo estádio. O clube será o primeiro na Itália a ter um estádio, o que deve aumentar a arrecadação do clube em até 20% O time tem um elenco apto a trabalhar com o esquema de jogo de Guidolin ou de Spaletti (por mais diversos que os dois sejam) e haverá investimentos para que o título de 2012 seja juventino na estreia do estádio. Além disso, a Juve sairá de 2011 com a menor folha salarial entre os três grandes e um CT novo em folha, em Vinovo – parte da programação da construção do estádio.

Ainda há três grandes desafios para a Juve corrigir: um é na preparação física e departamento médico, cujo rendimento minou o trabalho de todos os treinadores pós-Moggi. O segundo é a qualidade dos campos de treino em Vinovo, (fato que pode ter muita influência na série interminável de lesões e que essas talvez não sejam culpa do DM-preparação); o último é a ascendência das eminências pardas no clube (das quais, restam Buffon, que está de saída, e Del Piero), que dificulta o trabalho de todos os treinadores (como Raúl fazia no Real Madrid).

Superados esses problemas, a Juve terá muito mais condições de retornar à elite europeia do que Milan e Inter no próximo quinquênio. O amargor das últimas temporadas (esta em particular) pode ser atribuído à desgraça que a gestão Moggi deixou como herança. Resta saber se, concluído o trabalho como um todo (estádio, CT, eliminação das eminências pardas no elenco), o diretor de futebol Giuseppe Marotta terá como trabalhar. A esperança bianconera descansa em uma certeza: mais cedo ou mais tarde, Inter e Milan terão de seguir a mesma cantilena – corte nas folhas salariais e questão estádio. Isso tomará tempo e dinheiro, sendo que este estará limitado pela gestão de rigor fiscal da Uefa. É daí que pode renascer o futebol italiano. Agora resta esperar.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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