Leonardo-Inter, uma aposta difícil de vencer

O que se murmurava há semanas se confirmou. Rafa Benitez, segundo o Guardian e a Sky inglesa, não é mais treinador da Inter. Na sede de Via Durini a diretoria está discutindo com o agente de Benitez o valor da rescisão, que deve ser oficializada nesta quinta. Tudo aponta para Leonardo como seu sucessor. Mais uma vez, Leonardo se apronta para entrar numa fria – assim como o foi quando assumiu um Milan sem Kaká e sem reforços. E para a própria Inter, a decisão não será a melhor e nem a menos pior.

Leonardo não tem dos jogadores o respeito que tem como ex-jogador, comentarista ou dirigente. Parte das fraturas de relacionamento que ele tinha no Milan – Maldini, Gattuso, Flamini, Oddo, Kaladze – começou aí. Na Inter, isso não será diferente. Na verdade, parte do problema de Benitez começou exatamente com um núcleo de ‘senadores’ interistas comandados por Javier Zanetti e Marco Materazzi. Mourinho comandou a Inter com mão de ferro e impediu qualquer insurgência contra ele. Não que Leonardo também não seja um disciplinador, mas tem menos bagagem que Mourinho, tatica e gerencialmente.

A escolha de Moratti, caso se comfirme Leonardo, será pela impossibilidade de que Luciano Spalletti se libere do Zenit porDILEMA Entre coração e razão...o técnico Leonardo conta de uma multa alta. Será um erro. Leonardo tem forte ligação com o Milan (que trará a ele uma oposição que os torcedores milanistas não dispensam a Benitez, Mourinho ou afins). Nas suas mãos, Leonardo teria um grupo cheio de ótimos jogadores, mas um ano mais velho e com uma auto-suficiência compreensível para um time que venceu tudo.

A alternativa descartada por Moratti seria a de oficializar Walter Zenga, ex-ídolo interista e treinador de segunda. Moratti não aceita considerar a temporada atual como perdida e aos seus olhos – corretamente – contratar o ex-goleiro seria admitir que o ano acabou e aguardar o mercado de junho para levar um nome de peso à Inter. Contudo, Leonardo corre o risco de virar um misto entre técnico-tampão e oficial,o que é o pior cenário possível. Se a Inter fizer uma boa campanha e chegar às últimas rodadas disputando troféus, Leo entra na temporada que vem com moral – mas isso é uma tarefa muito dura. Se for muito mal, sai em junho – ou antes, dependendo de quão mal; se seu trabalho for regular – o que é até estatisticamente o mais provável – passa à temporada que vem mas já com pressão e críticos, o que contaminaria também a temporada seguinte.

A menos que um técnico importante se desvincule imediatamente, Moratti tende a optar por um “famoso” que esteja desempregado, mas não há grandes opções disponíveis. Spalletti, Capello, Mourinho, todos foram cotados. Um nome temporário seria o mais conveniente para estancar a hemorragia lenta criada com a saída de Mourinho: reformula-se o elenco, cura-se quem precsia de tratamento (Sneijder, Samuel, etc), vende-se quem for inútil (i.e. Materazzi) e planeja-se cuidadosamente o ano seguinte, já com um grande nome no banco. Essa é a jogada de segurança, mas raramente os clubes a adotam. No caso de Moratti, menos ainda porque ele sente-se apegado à hegemonia interista, incapaz de aceitar o fato de o incomum sucesso interista não aconteceria sem a somatória de circunstâncias (Calciopoli, queda da Juve, purgatório do Milan) e um biênio de um técnico definitivamente acima da média.

Ainda há, como eu disse há semanas, há uma chance remota de Moratti bancar a “cria” de Mourinho, André Villas Boas, do Porto, mas certamente trataria-se de um risco e de uma multa a ser paga ao clube português. Porém, como Leonardo está à mão e ele adoraria dar um tapa na cara de Silvio Berlusconi (muito provavelmente a maior epítome da “Velha Itália” que atrasa o país em todos os aspectos), optar pelo brasileiro parece mais simples e cômodo. Contudo, mesmo tendo surpreendido na sua estreia como treinador, Leo ainda tem muito a aprender e não me parece que esteja disposto a sujar o pé de lama para fazê-lo (leia-se indo trabalhar em clubes menores, aprendendo novas técnicas de treinamento, etc).

Com um desfecho ou outro, é certo que a Inter melhorará em 2011. A preparação física de Benitez aparentemente criou-lhe muitos dos seus problemas, ele perdeu jogadores importantes como Eto’o, Sneijder, Samuel e Milito por algum período e sofria sim oposição interna – no elenco e diretoria. Mesmo sem experiência, Leonardo terá a seu favor um grupo querendo se reerguer, mais descansado, melhor fisicamente e com reforços. Seu grande desafio será o de remontar um time que tem a cara de dois antecessores sem poder fazer o elenco que deseja. Tudo isso, enfrentando a mágoa de uma torcida que certamente não o perdoará. Ele será capaz de sobrepujar tudo isso? No Milan, fez muito mais do que se imaginava. Fará o mesmo na sponda nerazzurra?

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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