O buraco no São Paulo

No Peru para enfrentar o Universitario, o São Paulo precisa da vaga na Libertadores. O ano pode – quase – acabar se o Tricolor não avançar. Um problema, Ricardo Gomes ainda não conseguiu resolver: como fazer para devolver consistência a um time que usa as peças certas de maneira errada.

O São Paulo de Gomes é no 4-4-2, uma obsessão sua que contraria a lógica. O Sâo Paulo recente (dos últimos anos) tem jogado melhor com três zagueiros explorando as bolas vindas das alas e liberando laterais. De qualquer forma, parece que ele não mudará de ideia. Neste caso, o enrosco passa diretamente pelos pés de Richarlyson e pelo isolamento de Washington.

O primeiro ponto é na defesa. Richarlyson não é lateral e tende a se acentrar. Essa foi a queixa maior de Muricy Ramalho durante todo o ano de 2008 e parte de 2009. “Ricky” tende a procurar a faixa central do campo para a armação da jogada e não só gosta de avançar como sai da sua faixa. Na posição, creio que a saída mais aceitável seria uma improvável: a de aclimatar o jovem Diogo, que tem um potencial imenso, a agir como defensor.



Legenda: em vermelho, os jogadores que não sofreria, alteração e em laranja, as posições que dariam consistência ao time (no lugar das prévias, em preto).

Isso viabilizaria a ida de Richarlyson para a parte do campo que gosta, à frente da defesa. Alí, outra alteração. Hernanes precisa ser desincumbido da função de armar a jogada. É um grande jogador, mas precisa engendrar a manobra aindo mais de trás, e não buscar a zona do último passe. Sua compleição física lhe dá capacidade para chegar como elemento surpresa, mas ele rende muito menos quando precisa agir como o camisa 10. Com Richarlyson e Hernanes na marcação, recuperaria-se a dupla que deu ao São Paulo os títulos de 2006 e 2007. E o problema da avenida deixada nas costas do primeiro na semifinal com o Santos seria resolvida, uma vez que um lateral mais fixo com Richarlyson teriam condições de vigiar o setor.

E qual a vantagem da passagem de Richarlyson ao meio-campo, com a saída de Rodrigo Souto? A utilização “default” de um marcador mais limitado é um clichê de técnicos brasileiros. Na Europa, normalmente os meio-campistas centrais tem incumbências de contenção, mas não se usa um cabeça de área e um segundo volante. Com Ricky e Hernanes, o time fica guarnecido. Jorge Wagner ganha a liberdade de poder cair para a esquerda, de onde dispara cruzamentos e Marlos passa a ser o cara do último passe, embora eu o veja ainda “verde” para a tarefa.

E Washington? Como não reconhecer o veio do goleador? O atacante ex-muitos times é um goleador nato, só que 1) limita a ação ofensiva, 2), diminui a velocidade do time e 3) facilita a marcação do adversário. Isso tudo ainda sem lembrar do fator mais importante: Washington desagrega. Bem ou mal, o futebol tem suas convenções e depois da chegada dele ao Morumbi, o elenco jamais esteve fechado. O atacante tem o hábito de reclamar via imprensa e isso não é tolerável. Sem falar que Fernandinho tem características mais completas que Washington, embora seja mais indicado como segundo atacante.

E as más fases de Dagoberto, Richarlyson, Cicinho e afins? Isso é problema de Gomes. Uma questão é certa: o time não confia no esquema e tem razão nisso. O diagrama de Gomes é mais ofensivo do que poderia, agindo com um marcador e dois laterais que apoiam tendo só dois zagueiros. Gomes não vê o óbvio depois que tentou enterrar a herança tática de Muricy e insiste em querer manter uma fórmula que só funciona contra adversários padrão Paulixão. O Universitário Lima pode até sucumbir, mas sem resolver esse imbróglio que começa em Richarlyson e termina em Washington, o São Paulo não passa da fase seguinte.

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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