B de Boa

Nem tudo é motivo de lamentação na Itália. Se a divisão maxima sofre para suprir a ausência do maior time do país, assiste uma queda de público sensível (mais de 10% a menos do que a temporada anterior) e teve uma saída de talento precioso rumo ao exterior (Thuram, Zambrotta, Shevchenko), os italianos voltaram a descobrir que existe vida embaixo do tapete. Graças à uma série de circunstâncias, a Série B 2006/07 vive um de seus melhores campeonatos de todos os tempos.

A primeira causa para o ‘revival’ da segunda divisão italiana é, certamente, a presença nas suas filas da Juventus. A presença da ex-campeã italiana faz com que a cada duas semanas alguma equipe pequena hospede um time que leva muito mais torcida quando joga longe de Turim. Na partida de sábado passado, contra o Albinoleffe, o estádio Atleti Azzurri D’Italia estava totalmente tomado (mais de 26 mil lugares), sendo que a media de público do clube bergamasco não passa de 2 mil espectadores.

Mas não é só a Juventus. Napoli, Genoa e Bologna também tem um gosto de primeira divisão, e os jogos entre esses clubes têm tido públicos muito acima da media da Série A. Também na última rodada, Napoli e Bologna levaram mais de 50 mil espectadores ao estádio San Paolo. Na media, a Série B está atraindo 25% a mais torcedores do que no ano anterior, e somente sete dos 22 clubes (Juventus e Lecce, que vêm da primeira divisão, inclusos) estão tendo platéias menores do que no ano anterior.

A punição flácida aos envolvidos do ‘Calciocaos’ acabou deixando sua marca na primeira divisão. Somente Parma, Cagliari e Atalanta têm tido rendas maiores em 2006 do que no ano anterior. Apesar da Juve – a maior envolvida – estar na Série B, a sensação generalizada é de que ninguém foi punido. E isso não deixa de ser verdade.

Os ganhos ocasionados pelo maior ‘equilíbrio’ entre as duas divisões são notórios. Já se fala em renegociação dos direitos de transmissão por causa do crescimento na audiência, os clubes da Série B ganharam mais espaço na mídia e partidas dos ‘grandes’ da B vêm tendo até um certo destaque, em comparação a jogos menos interessantes da Série A.

Rede de Intrigas

A derrota do Milan para a Roma fez com que a cortina caísse em Milanello, e somente graças à uma intervenção conjunta do técnico Carlo Ancelotti e do vice-presidente Adriano Galliani, é que a coisa não degringolou de vez.

Os jornais da terça-feira noticiaram uma briga entre o zagueiro Bonera e o armador Gourcuff no treino da segunda, supostamente causada por uma entrada mais forte. Quando tudo parecia somente um aumento da tensão por causa da má campanha, uma reportagem da Gazzetta Dello Sport na quarta-feira revelou que nenhuma briga tinha acontecido, e que a notícia tinha sido ‘inventada’ por um jogador do Milan, veterano, que estava trabalhando para derrubar Carlo Ancelotti.

As suspeitas recaem sobre Costacurta, que embora seja amigo de Ancelotti há décadas, tem um histórico grande em derrubar treinadores. Ancelotti deu uma entrevista no dia seguinte, negando tudo (coisa rara, porque normalmente ele nao fala desse tipo de assunto), e ainda escalou Costacurta para a partida contra o Empoli (o que tirou a suspeita de cima do jurássico zagueiro).

O fato é que mesmo com a boa vontade de Ancelotti, o episódio revelou que o vestiário do Milan não é a ilha de harmonia que o clube quer fazer parecer. Galliani teria ficado fulo da vida com a ‘traição’, mas no melhor estilo maquiavélico, teria decidido resolver tudo sem escândalo.

Outras conclusões vieram da semana espinhosa do Milan (que empatou com o Empoli em seu desfecho). O clube e o elenco já desistiram completamente do campeonato e têm como única ambição a conquista da Liga dos Campeões. Tanto que, já em janeiro, uma ‘mini-reforma’ seria feita no grupo, onde alguns nomes saem (Cafu, Borriello), outros podem sair (Costacurta, Serginho) e certamente pelo menos três chegam (um para cada setor).

O ano começou torto para o Milan, que escapou do rebaixamento, e só tem uma chance de terminar melhor: um título na LC. Convenhamos, mesmo com todo o poderio econômico do clube, a tarefa não é nem um pouco fácil.

Giampaolo, o Al Pacino da Sardenha

Quando Simone Pepe aproveitou o rebote do chute de Suazo e fez o gol que garantiu ao Cagliari uma vitória sobre o até então líder Palermo, as câmeras da Sky Itália deram um close num homem extremamente parecido com o ator americano Al Pacino. Ele não sorria, mas observava com uma calma que provavelmente encobria a satisfação de ver seu trabalho começar a dar frutos.

Talvez Marco Giampaolo nem seja assim tão parecido com Al Pacino como aparentava no close feito pelas câmeras da Sky, mas os frutos de seu trabalho são inegáveis. Depois de começar como olheiro no Pescara, Giampaolo trabalhou nas comissões técnicas do Giulianova e no Treviso, que deixou para ser o assistente técnico do Ascoli, em 2004.

Por sorte ou visão, a diretoria do Ascoli acreditou tanto no trabalho de Giampaolo que fez uma armação para permitir que ele comandasse o time. No papel, o técnico era Massimo Silva, e o treinador de Bellinzona era o assistente, mas na realidade, a trama era só para burlar uma exigência da associação de treinadores, pois Giampaolo ainda não tinha a habilitação necessária (o técnico acabou suspenso por dois meses pela tramóia).

O fato é que com o Ascoli, Giampaolo chegou à Série A com todo mundo apostando em seu rebaixamento, mas acabou aa temporada num honroso 12o lugar, ao lado da Udinese e com um recorde de gols para o clube marchigiano na divisão de elite, marca que lhe valeu um convite para comandar o Cagliari, clube presidido por Massimo Cellino, dirigente useiro e vezeiro em demitir treinadores.

No Cagliari, Giampaolo perdeu os dois primeiros jogos (para Reggina e Catania) e chegou à terceira rodada com somente um ponto, dando a impressão de que Cellino teria um prato cheio para demitir. Mas, depois disso, o Cagliari não perdeu mais, graças à um setor defensivo muito inteligente e, no caminho, derrubou dois times como Sampdoria e Palermo.

Giampaolo manteve o mesmo esquema que o Cagliari usava no ano passado, um 4-3-3 que aproveita a velocidade de Suazo, Langella e Esposito para contra-golpear. O que mudou da derrota da Reggina em diante foi que ele ‘domesticou’ alguns atletas mais rebeldes (como Langella) e conseguiu azeitar a defesa tirando o melhor de Danielle Conti (filho do campeão mundial Bruno Conti) no meio-campo.

Contra o Palermo, o time de Giampaolo fez uma partida perfeita, evitando riscos até quando tinha um homem a mais. Com a solidez da defesa, o ataque do time começa a se soltar. Lembremos que a cautela do técnico é mais do que necessária, dada a vocação que Cellino tem para demitir ao menor sinal negativo (leia-se: perdeu, caiu).

Giampaolo chegou a ser cogitado para a Inter, mas acabou indo para Cagliari, de onde certamente sairá na próxima temporada, caso repita o trabalho de Ascoli. Ele deve ter em mente que não pode ‘perder a hora’ de sair, como aconteceu com Serse Cosmi, que fez chover no Perugia e depois purgou seus pecados na Udinese. Giampaolo parece ser mais do que outro nome mediano. Vale a pena acompanhar para ver como ele vai se sair.

– Tantos foram os rumores de transferências para o Milan nesta semana, que esta coluna se calará, para não dar vazão à imaginação de empresários malandrões.

– Mas uma coisa que parece certa é a renovação de contrato de Dida, por mais quatro anos.

– Cassano, queimadíssimo em Madri, deve voltar à Itália.

– Se a palhaçada de ‘Calciopoli’ ficou sem punição, ao menos a investigação sobre a GEA continua andando.

– Rememorando: a GEA era a companhia de agenciamento de jogadores que pertencia ao filho de Luciano Moggi, ex-capo da Juventus.

– Com seu poder na Juve, os Moggi, coagiam jogadores e treinadores a aceitarem seus serviços.

– Segundo a acusação, entre as ‘vítimas’ de coação estavam David Trezeguet, Manuele Blasi, Giorgio Chiellini, Nicola Amoruso, Ruslan Nigmatullin, Ilyas Zeytulaev, Victor Budianski, Davide Baiocco, Fabio Gatti, Giovanni Tedesco e Salvatore Fresi.

– vejamos onde acaba…

– Seleção da 12a rodada da Série A:

– Balli (Empoli); Loria (Atalanta), Panucci (Roma), Chivu (Roma) e Modesto (Reggina); Mancini (Roma), León (Reggina) e Mauri (Lazio); Totti (Roma); Montella (Roma) e Crespo (Inter).

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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