Cabeça a cabeça

Apenas algumas rodadas atrás, o internauta lembra, que esta coluna cravou que a Juventus parecia ter encomendado a taça do Italiano. Pois é. O que consola este colunista é que o palpite era dividido por boa parte da imprensa séria (para não dizer toda), que já dizia em “campeonato decidido”.

Nas últimas sete rodadas, o Milan fez 21 pontos e está a uma vitória da sua marca da temporada passada, onde um ‘sprint’ de 24 pontos em oito semanas levou o time ‘rossonero’ ao ‘scudetto’. A fantástica reação fez a Juventus chamar seus brios e parar de patinar, mantendo o Milan na mesma linha.

Se o Milan contou com a ajuda clara da sorte (e em algumas vezes da arbitragem), a Juventus contou com a ajuda clara da arbitragem (e em algumas vezes da sorte) para estabelecer a briga mais ferrenha pelo título entre as grandes ligas da Europa. Diversos jogos foram decididos a favor dos atuais campeões depois dos 45min do segundo tempo, e várias foram as ocasiões em que a Juventus foi favorecida por um erro de arbitragem.

Até nisso a rodada passada foi parelha. O árbitro Racalbuto validou um gol irregular da Juventus e deu um pênalti inexistente (embora não tenha anotado um claro sobre Del Piero); em Bergamo, Bertini não deu um cartão vermelho que Nesta mereceria ter tomado por uma falta em Makinwa.

No momento, os dois times jogam quase da mesma maneira: transpiram muito e inspiram pouco. Mas tem bastado. Capello e Ancelotti não podem estar contentes com o jogo expresso por seus times, mas certamente não trocariam o rendimento de seus times por partidas espetaculares.

Os problemas mais trabalhosos de Ancelotti são de ordem individual. Kaká está jogando, na média, muito aquém do que pode, mesmo sendo decisivo com freqüência; Stam ainda se ressente da falta de ritmo de jogo e Pirlo também não está no seu ‘top’. Isso para não falar que a dupla de ataque titular – Sheva-Inzaghi – não está disponível por contusão. O que compensa tudo isso é uma defesa magistral orquestrada por Nesta e Maldini.

Na Juventus, Fabio Capello tem um problema sério individual (Nedved está fora de combate e está longe do fenômeno que venceu a Bola de Ouro), além de uma perda de potência no ataque, onde nenhum dos atacantes desfila uma forma excelente. Um super-goleiro, uma boa defesa e um time taticamente bem postado, sob o comando do odiado Emerson (odiado no Brasil, fique claro) são os trunfos do time ‘bianconero’.

Pressão infinita

O problema do momento na Itália não é nem o frio polar que transforma os gramados em pastos, nem o excesso de jogadores estrangeiros, nem a ausência de público nos estádios, ou tampouco o nível técnico do torneio. O que tem dado mais pano para manga na Série A desta temporada é a arbitragem.

O internauta pode dizer: “mas, mas isso é sempre assim”. Não, assim, nunca foi. Sempre os juízes tiveram suas mães achincalhadas pelas torcidas, e dirigentes e técnicos procurando colocar nos homens de preto a culpa por aquela bola que não entrou ou por aquele gol anulado que evitaria a derrota. Só que a contestação da arbitragem atinge hoje níveis inimagináveis, e os árbitros começam a sofrer a pressão dos clubes no momento do sorteio que define onde cada um atua.

Hoje, o sistema na Itália funciona assim: os árbitros dos jogos são escolhidos de acordo com o seu “status”. Se há uma partida importante, digamos Inter x Juventus, alguns nomes de árbitros de “primeira linha” são selecionados e ocorre um sorteio. O mesmo raciocínio vale para as outras partidas. Árbitros com menos experiência começam em partidas de clubes mais modestos. Fatores como a origem do juiz (se ele é desta ou daquela cidade) ou problemas prévios com determinado clube também fazem parte na seleção pré-sorteio.

O drama é que, exceção feita a Pierluigi Collina, considerado o melhor do mundo, todos os outros acabam sofrendo contestações. Para se ter uma idéia, das dez partidas da 27a rodada, somente quatro não tiveram choradeira dos perdedores em relação aos árbitros: Fiorentina 2 x 1 Reggina, Messina 1 x Lazio, Siena 2 x 3 Brescia e Udinese 0 x 1 Bologna.

Os juízes italianos são ruins? Não. Tecnicamente são bastante bons. O problema é que a pressão pelos resultados é tão grande que o clichê de descer o sarrafo no juiz para justificar uma derrota virou mania nacional. É raríssimo um técnico derrotado dizer que o árbitro estava bem. A imprensa também não ajuda: disseca cada lance no replay e semana após semana, é possível ouvir um comentarista falando que este ou aquele juiz é “fraco”, “medíocre”, ou “inadequado”.

“Temos de acabar com o sorteio. Há muita pressão sobre os juízes”. A opinião de Carlo Ancelotti, técnico do Milan, é a que vem ganhando adeptos nas últimas semanas, e provavelmente os jogos voltarão a ter sua arbitragem decidida por um comissariado. A grande pergunta é: se já se desconfia das arbitragens em sorteios, como é que a escolha humana vai poder encaixar a polêmica nos limites do aceitável?

O sistema arbitral italiano está sofrendo por causa de uma falta de confiança nas instituições, como a Lega Calcio (presidida por um dirigente milanista), a Federcalcio e a comissão de arbitragem. Como se generaliza a opinião de que os árbitros “erram de propósito”, cria-se uma instabilidade. A solução? Um sistema de árbitros profissionais, escolhidos com muito mais rigor e punições severíssimas para dirigentes que reclamassem de arbitragem, bem como para árbitros meio safardanas. Mas para isso, é necessário dar a cara para bater, porque a desculpa “fui o juiz!” não iria mais rolar. E quem tem colhões para assumir tal peso?

– Neste domingo, o Lecce bateu o recorde de pênaltis marcados contra uma equipe

– Já são dez as penalidades anotadas contra os salentinos

– A única equipe que não teve nenhum pênalti marcado contra si é a Juventus

– Curiosamente, no dia anterior à partida, o técnico do Lecce, Zdenek Zeman, disse, em entrevista à Gazzetta Dello Sport, que Luciano Moggi, diretor da Juve, tinha uma qualidade e um defeito

– “Sua qualidade é a de que comanda o futebol italiano; o defeito é que comanda mal”

– As palavras de Zeman, quanto ao poder de Moggi, não são tão distantes assim da verdade

– Moggi tem homens considerados de sua confiança no comando de várias equipes, como Siena, Livorno e Lazio

– Dizem os rumores que Moggi está trabalhando para colocar seu filho, atualmente um dos cabeças da GEA (a maior empresa de agenciamento de jogadores da Itália) no comando da Roma, substituindo Franco Baldini, um sabido adversário seu

– Alessandro Moggi, filho de “Lucky” Luciano, já deu até entrevista dizendo que gostaria de trabalhar na capital…

– Luca Toni (Palermo) e Adriano (inter) completaram 100 jogos pela Série A neste domingo

– Nos seus primeiros 100 jogos, Adriano marcou 54 gols, enquanto Toni anotou 36

– Esta é a seleção Trivela da 27a rodada

– Pagliuca (Bologna); Thuram (Juventus), Cannavaro (Juventus), Barzagli (Palermo) e Maldini (Milan); Camoranesi (Juventus), Di Biagio (Brescia), Ambrosini (Milan) e Bresciano (Parma); Makinwa (Atalanta) e Toni (Palermo)

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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