Operação Cana Braba

Na semana passada, o vice-presidente do Corinthians, Antonio Roque Citadini, na ESPN Brasil, numa de suas argumentações, falava de como o futebol italiano é cheio de maracutaias e problemas, e para exemplificar, citou o escândalo das apostas ocorrido no ano passado, que penalizou vários clubes e jogadores neste ano. A tese de Citadini é a de que problemas ocorrem em todos os lugares, e que a Itália não tem menos problemas que o Brasil, no que diz respeito a irregularidades.

Citadini está certo quanto ao fato do futebol italiano não ser um ambiente livre de problemas. A cultura italiana é latina como a brasileira, e também lá, os casos de corrupção, trambicagem e trapaças campeiam. O que Citadini não coloca em sua argumentação é que lá, diferente daqui, as investigações vão até o final, e – mais importante – culpados vão para trás das grades.

Na semana passada, o internauta leu nesta coluna sobre a condenação da Juventus no processo sobre o doping. Teoricamente, o clube Juventus não foi condenado, mas seu médico, Ricardo Agricola, deve passar 22 meses atrás das grades, caso seu recurso da decisão não seja acolhido.

No final da mesma semana passada (que deve ter marcado os dirigentes italianos com um frio na barriga), outro processo famoso começou a ver medidas sendo tomadas. Franco Sensi (dono da Roma) e Sergio Cragnotti (ex-dono da Lazio) foram indiciados por ‘doping administrativo’ e se forem considerados culpados, também vão para a cadeia.

Só relembrando: o ‘doping administrativo’ consistia numa manobra contábil onde jogadores eram vendidos e contabilizados com valores irreais, para atestar a “sanidade financeira do clube”. Por exemplo: o veterano atacante Poggi foi para o Parma em 2002 por € 8 milhões, quando seu passe dificilmente custaria pouco mais de 1% desse valor. Também relembrando, o atestado de sanidade financeira é necessário para que os clubes italianos possam se inscrever nos campeonatos, coisa que não acontece no Brasil.

A maré de decisões da Justiça italiana nas últimas semanas é resultado de uma espécie de devassa ocorrida na Itália mais ou menos três anos atrás. Quase de uma só vez, inquéritos sobre falsificação de passaportes, doping, doping administrativo, conduta irregular de atletas em apostas (uma lei de 1989 proíbe os atletas e seus jogadores de apostarem – e é isso que ocasionou o escândalo mencionado por Citadini).

Será possível que mais este processo possa acabar em xilindró para a malandragem de cartola? De todos os processos, o que tem mais probabilidades de levar a moçada espertalhenta para o cárcere é justamente este. Isso, porque nesse caso, as lesões causadas por Lazio e Roma (mas não só) atingiram o mundo dos negócios, que não tem nenhuma afinidade com os “finais em pizza’” que o pessoal do futebol está tão habituado. Cragnotti já passou um tempo na cadeia. Os Tanzi, ex-donos do Parma, também já conheceram as acomodações carcerárias. E é bem difícil que a lista termine se ser datilografada só com esses nomes. Imagina se a moda vem para o Brasil?

Cinismo Italiano

Os líderes do Italiano jogaram mal neste final de semana. Não resta dúvida. A Lazio deu um suador na Juventus, até com direito a Cannavaro fazendo a moral do macedônio Pandev, e em Parma, no Ennio Tardini, o Milan ganhou do Parma, segundo palavras do próprio técnico Carlo Ancelotti, “de forma mais sortuda que merecida”.

E exatamente neste final de semana é que pudemos ver por que Juve e Milan é que são os dois que vão lutar pelo título. O segredo para se vencer num campeonato longo é o de pontuar mesmo quando se joga mal, porque é impossível passar 38 rodadas com bom futebol. E aí, Capello, Ancelotti, Juve e Milan são imbatíveis.

A objetividade da Juventus veio à baila depois que Pandev colocou a defesa juventina para dançar. Aliás, no jogo contra o Parma, a Juventus, pela primeira vez, mostrou uma insegurança que levantou suspeitas. Toda a defesa esteve mal (com destaque especial para Thuram), e Capello só foi acertar o time no segundo tempo. A vitória veio assinada com o nome de Zlatan Ibrahimovic, que cada vez mais, se firma como a pilastra mais forte do ataque ‘bianconero’.

Em Parma, o Milan não jogou tão mal quanto a Juventus, mas não teve brilho. Para piorar as coisas, a primeira bola que o atacante Emiliano Alberto Gilardino recebeu em condições acabou no fundo das redes de Dida, com cumplicidade indiscutível do próprio goleiro (que depois se redimiu com boas defesas) e da dupla de zaga “worldclass”, Maldini-Nesta.

O Milan só despertou quando Ancelotti sacou um cansado Gattuso e um apagado Seedorf, para mandar a campo o francês Dhorasoo (cada vez mais uma peça importante deste Milan) e o brasileiro Serginho. Dhorasoo iluminou o meio-campo com as idéias que Pirlo não estava tendo, e o brasileiro alargou o jogo pela lateral. Justiça divina ou não, o Milan acabou chegando ao resultado (merecido, no frigir dos ovos), em duas jogadas de bola parada.

A perseguição do Milan em relação aos líderes só aumenta o interesse do clássico da 16a rodada, quando o técnico Capello enfrenta o Milan pela primeira vez em Turim. Se a Juventus vencer, pode abrir sete pontos (caso os dois venças na 15a rodada), uma distância que Capello pode gerenciar até o final do torneio; vencendo o Milan, embola a briga. O verdadeiro prêmio em disputa nesta partida será no moral. O time que ganhar começará o ano novo com a confiança nas alturas.

Surpresa do Friuli

Mantendo seu estilo “low-profile” dos últimos anos, a Udinese começou esta temporada apostando em nomes menos conhecidos. Esta temporada teve somente um diferencial: os dois nomes que eram mais cotados para negociação (o volante Pizarro e o ala Jankulovski) não partiram, porque o clube achou que as ofertas pelos seus passes não eram adequadas. Jankulovski chegou a acertar um contrato com a Juventus, mas a Udinese não cedeu.

“Reforçada” por Pizarro e Jankulovski, a Udinese do técnico Luciano Spaletti teve pela primeira vez em vários anos a oportunidade de começar o torneio com um time bem parecido com o do ano anterior. E o entrosamento do time está trazendo resultados que mesmo os mais otimistas não estavam prevendo.

Hoje em terceiro lugar, o clube friulano estaria classificado para a Liga dos Campeões do ano que vem, se o campeonato acabasse hoje. Claro, ainda faltam mais 24 rodadas e muita coisa pode mudar. Mas é possível afirmar sem medo de errar que a Udinese tem recursos para conseguir a vaga européia na LC, porque tem um esquema de jogp definido, um bom elenco e um treinador capaz.

Spaletti monta a sua Udinese num 3-5-2 clássico. O goleiro é o ótimo Morgan De Sanctis, reserva de Buffon em todas as divisões juvenis da seleção italiana. À sua frente, a zaga tem os experientes Sensini (38 anos) e Bertotto (capitçao do time), além do brasileiro Cribari. Sensini joga na sobra, com os outros dois marcando os atacantes adversários. Quando enfrenta três atacantes, o volante Muntari é encarregado de pegar o terceiro homem.

O meio-campo do time é forte fisicamente. O chileno Pizarro é o central, sendo responsável pela armação do jogo; Pazienza (ou Pinzi, atualmente machucado) e o já citado Muntari fazem a dupla de medianos, com o italiano Mauri e o excelente tcheco Jankulovski pressionando pelas laterais. Parte da força da Udinese está aqui. O tcheco é lateral em sua seleção, e assim, desenvolve um trabalho eficiente, tanto na marcação quanto no apoio. No ataque, Spaletti usa dois atacantes, com o móvel Di Michele e o centroavante Iaquinta, com as opções de Di Natale e Dino Fava.

Outra parte do sucesso da Udinese está no fato do time encarar Juventus e Atalanta da mesma maneira, sem se colocar como um time “grande”. Spaletti põe a equipe para atacar mesmo quando joga em casa, estimula avanços dos meio-campistas e coordena bem o trabalho de marcação dos seus atacantes, que nunca ficam estáticos durante a partida.

Se a Udinese conseguir a vaga para a Liga dos Campeões, pode iniciar um ciclo na Série A, uma vez que os times da capital estão debilitados financeiramente e, dificilmente, poderão abrir os bolsos para sobrepujarem a concorrência provincial. Exceção feita a Juventus, Milan e Inter, hoje há pelo menos meia dúzia de clubes com a mesma bala na agulha.

O romanista Francesco Totti bateu um recorde neste final de semana

Chegou aos 106 gols pela Série A com a camisa da Roma, alcançando o atacante Roberto Pruzzo, e dividindo com ele o mérito de ser o maior artilheiro do time ‘giallorosso’

Dois técnicos da Série A perderam seus empregos nesta 14a rodada

O primeiro é da lanterna Atalanta

Andrea Mandorlini, que debutou na máxima divisão nesta temporada saiu, e o ex-técnico do Lecce, Delio Rossi, é o nome mais cotado para assumir

O outro a perder o caso foi Mimmo Caso, da Lazio

Apesar de uma derrota para a Juventus, em Turim, ser mais do que normal, Caso paga especialmente pela eliminação na Copa UEFA

Até esta segunda à noite, a demissão ainda não tinha sido anunciada, mas segundo a imprensa da Itália, a espera seria para poder já anunciar o novo treinador

E esta é a seleção TRIVELA da 14a rodada

Guardalben (Palermo); Córdoba (Inter), Mihajlovic (Inter), Bega (Cagliari) e Bonera (Parma); Camoranesi (Juventus), Cambiasso (Inter), Fábrio Simplício (Parma) e Pandev (Lazio); Langella (Cagliari) e Adriano (Inter)

Cassiano Gobbet
Cassiano Gobbet é jornalista, formado pela Universidade de São Paulo e mestre em jornalismo digital pela Bournemouth University.
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